Com os punhos fechados na vida real

Nas redes sociais, o cartão postal de Curitiba tem o filme queimado





FLIP

Longe, mais bem longe dos verdejantes parques e sua arquitetura organizada, existe uma cidade chamada Curitiba, com todas as cores e contrastes, desorganização e conflitos que uma metrópole abarca. Essa Curitiba estrategicamente escondida atrás de seus contornos e linhas verdes, foi exposta no mais importante encontro de literatura do Brasil, a FLIP – Feira de Literatura Internacional de Paraty (RJ). Como se fosse um microscópio a focar os pigmentos dos preconceitos da cidade “mais europeia” do Brasil, uma senhora com mais de seus 70 anos, negra e com seus cabelos grisalhos, confessou o que os negativos da cidade se negam a revelar em seus cartões-postais.

Diva Guimarães contou que é do interior do Paraná, “lá do mato”, e que sobreviveu como brasileira porque teve uma mãe que fez de tudo para que ela pudesse estudar. Segundo Diva, ela foi recrutada por um convento aos cinco anos e, em vez de apenas estudar, ela já iniciou sua vida no trabalho. “Sou neta de escravo e, aparentemente, nós tivemos uma libertação que não existe até hoje”, relatou.

Em seguida ao relato de como foi criada por sua mãe, dona Diva contou sua experiência com Curitiba. Ela questionou o mito da cidade modelo. “Curitiba é tida como evoluída. Tem coisas boas. Mas os cotistas negros, índios, sofrem preconceito dentro das universidades”. E completou: “Vai viver em Curitiba como negro e morador da periferia e se perde o encanto”. O depoimento, que viralizou nas redes, pode ser encontrado no Facebook da FLIP: Flip – Festa Literária Internacional de Paraty.

Página no Instagram posta imagens da periferia de Curitiba.

Já no Instagram, uma conta chamada “A Curitiba de verdade” (@curitibareal), lançada em julho, questiona os modelos de beleza arquitetônico da capital do Paraná. A conta descreve que “é um perfil dedicado à procura da Curitiba real, longe dos jardins floridos, dos tubos redondos e dos arames torcidos para turista fotografar”. As postagens, em uma rede social mais utilizada para enaltecer os egos das pessoas, mostra as vilas de Curitiba, as paisagens sem estrutura como asfalto, iluminação, revelando a ausência do poder público.

“Para além da Curitiba central, dos bairros ditos nobres, há a cidade real, onde vive a grande maioria dos curitibanos. Como em toda metrópole latino-americana, a maior parte das pessoas têm um cotidiano sofrido, marcado pela renda insuficiente, pelos problemas de infraestrutura e pela violência nas regiões onde residem”, aponta o perfil sem autor definido.