PL para reduzir violência policial está parado na Câmara há cinco anos

Audiência volta a debater apuração rigorosa dos chamados autos de resistência registrados pelas PMs. Segundo pesquisas, 60% dos casos consistem em execuções de civis, sobretudo contra negros e pobres




FonteHylda Cavalcanti - RBA

Os chamados autos de resistência, nome dado às ações de agentes policiais do Estado que resultam em mortes ou lesões corporais de cidadãos, é objeto do Projeto de Lei (PL) 4.471, que estabelece regras rigorosas e a instalação de inquéritos para a apuração dos casos que levam à mortes e danos físicos decorrentes de atos violentos cometidos por policiais, mas há cinco anos a matéria aguarda para ser votada pela Câmara dos Deputados. A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara (CDHM), realizou audiência pública sobre o tema esta semana e pretende se debruçar sobre a questão, com vistas a acelerar a tramitação do PL.

De acordo com o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), autor do PL 4.471 e um dos autores do requerimento que pediu a audiência, estudos diversos demonstram que 60% dos autos de resistência registrados foram, na verdade, execuções, uma vez que não se comprova a resistência à ação policial por parte das vítimas –, os números apontam que as ocorrências desse tipo seguem em alta expressiva desde 2013. Tais execuções são tratadas, pela PM e por setores da mídia, como “resistência seguida de morte”

“O que estamos pedindo é que isso seja investigado, que toda atividade policial que leve à morte de um cidadão, passe a ser investigada”, disse Teixeira.

“Qualquer um de nós”

As palavras do parlamentar foram repartidas com os parentes de vítimas de violência policial que foram à comissão para dar seus depoimentos. “Estou aqui para pedir a aprovação desse projeto e falar da morte do meu filho. A bala que pegou no meu filho pode atingir qualquer um de nós. O auto de resistência é uma carta branca para que a polícia possa matar e, infelizmente, o que acontece hoje no Rio de Janeiro é explorado de forma mais forte no Rio, mas também sabemos de casos sérios em Salvador e Natal”, protestou Vera Lúcia da Silva.

“O país inteiro sofre com este absurdo. Os jovens não têm oportunidade e cometem delitos. Infelizmente, ao invés de serem recuperados, terminam mortos sem poderem se defender”, acrescentou Maria Lúcia.

“Quando observamos as ações que envolvem o emprego de força letal policial, designados genericamente como ‘resistência seguida de morte’ ou ‘autos de resistência’, a conclusão a que chegamos é de que vários casos não são submetidos à investigação no sistema de Justiça, que deixa de avaliar a possível ocorrência de crime doloso e silenciando episódios de violação de direitos humanos praticados por agentes do Estado, principalmente contra jovens negros”, disse Teixeira.

O Código de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689/41) autoriza o uso de quaisquer meios necessários para que o policial vença a eventual resistência à prisão, além de determinar que a ação seja registrada em auto assinado por duas testemunhas. O problema, segundo o deputado, é a constatação do uso desproporcional da força e da violência apontado pelos estudos apresentados durante a audiência.

Fiscalização da segurança

O requerimento que levou à audiência na CDHM, também assinado pelos deputados Paulo Pimenta (PT-RS) e Alessandro Molon (Rede-RJ), destaca que a comissão pretende debater cada vez mais a ampliação do controle e da fiscalização sobre a atividade de segurança pública, de maneira eficiente e independente.

Segundo os deputados, o objetivo é contribuir para a redução de excessos e garantir a responsabilização pelos atos que não estejam condizentes com as conquistas do Estado democrático de direito e com os anseios da população pela redução da violência estatal e da letalidade de suas ações.

Molon explicou que o PL está pronto para ser votado, mas tem sido alvo de constantes estratégias para seu engavetamento. Na audiência, participantes lembraram palavras do educador Douglas Belchior, militante do movimento negro, para quem o texto em tramitação na Câmara tem o objetivo de “contrapor e contestar essa naturalização da violência da polícia e do Estado, principalmente aquela dirigida à população negra e à juventude”. As práticas foram chamadas de resquícios de escravidão e de ditaduras.