Por Gibran Mendes e Manoel Ramires

Nesta quinta-feira (31) o Golpe de 2016 completa um ano. Foi nesta data que 61 senadores, contra 20, decidiram afastar definitivamente uma presidenta eleita alegando crime de responsabilidade. De lá para cá, a popularidade de Michel Temer (PMDB), que assumiu o posto em uma conspiração com os tucanos, despenca na mesma velocidade que a economia e os direitos sociais.

Para marcar a data, a presidenta eleita já confirmou presença em um ato no Rio de Janeiro a partir das 18h, na Rua Araújo Porto Alegre, 71. Dilma Rousseff fará um balanço dos retrocessos ocasionados pelo Golpe de 2016.

O Porém.net buscou lideranças em suas áreas para que pudessem analisar o que mudou no Brasil um ano após a retirada de Dilma da Presidência da República. O processo teve início no dia 02 de dezembro de 2015, com a autorização do então presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB), que atualmente está preso em Curitiba.

Confira:

Gleisi Hoffmann, senadora e presidente nacional do PT


A senadora Gleisi Hoffman foi uma das parlamentares que mais combateram o impeachment. Foto: Geraldo Magela/Agência Senado/Fotos Públicas

“Estão desmontando o Estado brasileiro. Vendendo o Brasil em um saldão. Retirando direitos dos trabalhadores. Vão acabar com a proteção social da Previdência e a Emenda Constitucional 95 vai prejudicar o lado mais vulnerável da população, incapaz de reagir em momentos de turbulência sem o apoio do Estado. Tudo piorou depois que a Dilma saiu”.

Hermes Leão, presidente da APP-Sindicato, que representa os professores e funcionários de escola da rede pública de ensino do Paraná

Hermes Leão, presidente da APP-Sindicato, tem travado luta contra perda de direitos no funcionalismo. Foto: Gibran Mendes

“O que mudou? Aprofundou a violência. A violência sobre os direitos sociais, sobre os direitos trabalhistas. Nós, aqui no Paraná, já vínhamos com cenário de ataques violentes desde o final de 2014 e de um ano para cá se intensificou essa linha de ataques. Motivado, com certeza, pela pauta nacional e do alinhamento do Governador Beto Richa com esse governo ilegítimo do Michel Temer”.

Professor Lemos, deputado estadual

Professor Lemos, deputado estadual no Paraná. Foto: Leandro Taques

“Um ano de retrocesso. Um ano que o país regrediu décadas. E pior, vai regredir ainda mais. A Reforma Trabalhista é um escândalo. Os trabalhadores ainda não se deram conta disso. Essa falácia de que com essa Reforma vai se criar mais empregos, isso é um absurdo. E essa Reforma da Previdência? Isso não é Reforma, é extinção. Querem acabar com a seguridade social, querem acabar com o SUS. Tudo em nome do capital. Não investem na saúde pública, para vender atendimento. Não investem na educação, para vender conhecimento. É a redução escancarada do estado. O neoliberalismo na sua essência. Estado mínimo. Tudo em nome do Mercado. Mais do que nunca vivemos um momento de resistência”.

Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do SIND-UTE, dos professores da rede pública estadual de Minas Gerais

Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do Sind-UTE. Foto: Gibran Mendes

“O Brasil está sendo fatiado, vendido e privatizado. Eles tiveram a covardia de fazer o que nem a ditadura civil-militar de 1964 fez que foi acabar com a CLT. Aprovaram uma reforma trabalhista sem nenhum debate público. O congelamento dos investimentos por 20 anos é a destruição do estado brasileiro como nós o conhecemos. Estão impondo uma outra constituição por meio de um golpe de um congresso nacional que não foi eleito para revisar a constituição. Esse golpe não foi contra um partido ou uma pessoa. Foi um golpe de classe, de gênero para tirar o Brasil de uma arena internacional que atuava de forma independente”.

Professora Josete, vereadora de Curitiba

Professora Josete, vereadora em Curitiba. Foto: Chico Camargo/CMC.

“O golpe teve impacto na legislação municipal e nos serviços públicos. Temos estes desdobramentos no nível municipal, como congelamento dos planos de carreira (do funcionalismo público), não cumprimento da data-base e outros direitos dos servidores. Assim como, agora neste momento, a aprovação da lei que permite, na área da saúde e educação, que as OS’s possam atuar em Curitiba. É o projeto de terceirização que se desdobra em uma legislação municipal. Temos buscado fazer essa correlação com o golpe e fazer essa denúncia. Temos também a postura do Prefeito de Curitiba, Rafael Greca, passando sua receita neoliberal para prefeitos de municípios do entorno da capital”.

Heleno Araújo Filho, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação

Heleno Araújo Filho, presidente da CNTE. Foto: Gibran Mendes

“O Brasil mudou muito e para pior. São mudanças na Constituição Federal que mexem na estrutura do direito social da população brasileira e que ataca de forma intensa os direitos da classe trabalhadora. É uma mudança ruim para o povo brasileiro. Aquilo que eles falaram, de melhor a economia, é uma farsa, uma mentira e agora estão entregando todas as riquezas que ainda temos, tanto patrimonial quanto natural, para empresas estrangeiras. O resultado será que colocará o Brasil em uma situação terrível nas próximas décadas”.

Nasser Allan, advogado e doutor em Direito pela UFPR

Nasser Allan. Foto: Divulgação / Instituto Declatra.

“Infelizmente constatamos que tudo aquilo se falava que ocorreria, ocorreu. Nós temos um grupo que representa o que há de pior na política no Brasil. Eles tomaram o poder e vêm promovendo uma série de reformas contra os interesses da população e beneficiando determinados grupos. Temos uma ameaça de reforma da previdência que vai elevar em 15 anos o tempo de contribuição da maior parte da população para poder se aposentar. Temos renuncias fiscais de dívidas previdenciárias dos grandes grupos empresariais e renunciais fiscais no setor agropecuário, dos grandes latifúndios. Temos também a tentativa de venda de empresas estatais a preço de banana, a tentativa de venda da Amazônia e a tentativa de reforma política com a finalidade de eternização dessas pessoas no poder com diminuição dos espaços públicos e políticos para exercício das minorias. Além, claro, da reforma trabalhista que é uma forma de aumento na exploração da mão de obra e aumento de permitir a maximização dos lucros pelo grande capital financeiro”.

Regina Cruz, presidenta da CUT Paraná

Regina Cruz, presidenta da CUT Paraná. Foto: Gibran Mendes

“Em um ano observamos a economia em queda livre, assim como os direitos sociais, os direitos trabalhistas. Na proporção oposta observamos uma farra de incentivos para grandes grupos empresariais, com o perdão da dívida e um presidente que se esquiva para escapar de denúncias de corrupção. Não há dúvida alguma que o Brasil de hoje é muito pior do que era antes do golpe”.

Golpe não recuperou a economia

Com estagnação da economia, desemprego segue elevado no Brasil. Marcos Santos/USP Imagens

Um dos elementos políticos para o afastamento definitivo da presidente Dilma consistia a possibilidade de recuperação econômica. O mesmo argumento, inclusive, foi utilizada pela base governista em 2 de agosto para evitar que o presidente Temer fosse investigado por corrupção no grampo com a JBS. Porém, números do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) apontam para uma estagnação na geração de empregos no Brasil. Em São Paulo, o desemprego atingiu 18,3% da população ativa no mês de julho. Em 2016, a taxa estava em 17,4%. Para o Boletim do DIEESE, embora “os principais indicadores do mercado de trabalho sugerem um cenário de maior estabilidade, uma melhora consistente do mercado de trabalho só acontecerá com a retomada do crescimento econômico”.

A entidade também alerta para a precarização do trabalho neste último ano. “Com baixo nível de produção e de emprego, este ainda em condições bastante desestruturadas, com redução da contratação formal e aumento das inserções mais precarizadas. Há também o agravante das disputas em torno das reformas nas relações de trabalho e previdenciária. A primeira, já aprovada no Congresso, certamente intensificará o quadro de precarização da inserção laboral no país”, explica o Boletim do Emprego.

Trabalhadores perderam poder de negociação

Foto: Leandro Taques

O medo do desemprego também agravou a força de entidades sindicais durante as negociações. O Departamento analisou 714 acordos e convenções coletivas de entidades sindicais urbanas do setor privado dos setores da indústria, do comércio e dos serviços de todo o país. A conclusão foi de que “os resultados de reajustes e aumentos salariais foram muito ruins”. Nem mesmo as graves foram capazes de garantir direitos ou poder de compra do trabalhador. Em 2016, foram registradas 2.093 greves. Dessas, mais da metade (52,6%) foi na área pública (1,1 mil), principal alvo dos ajustes econômicos. Já na esfera privada, as greves atingiram 986 registros.

Em 2016, cerca de 81% das greves incluíam itens de caráter defensivo (manutenção de direitos) na pauta de reivindicações e mais da metade (56%) denunciava descumprimento de direitos.