Diante dos altos índices de reprovação do governo federal – o pior desde o fim da ditadura militar – o presidente Michel Temer (PMDB) tem apostado na tática de exaltar índices econômicos e no objetivo de manter a inflação abaixo da meta de 4,5% ao ano. No início de setembro, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) divulgou que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acumulado nos 12 meses anteriores havia registrado 1,73%. Já a prévia do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15) ficou 0,24 ponto percentual abaixo da taxa de agosto, quando marcou 0,35%.

Porém o otimismo do governo com os números não se reflete em entusiasmo da população, que não sente seus efeitos ao início de cada mês quando os boletos começam a surgir.

“Esse é o pior ano de todos que eu já vi, desde outubro do ano passado. Meu salário reduziu, meu condomínio só aumenta, tudo está mais difícil”, aponta Mara Correia, trabalhadora terceirizada de uma empresa estatal. “Está cada vez mais difícil conseguir pagar as contas do mês”.

Não há o que se comemorar quando a baixa inflação é resultado de um cenário de recessão, desemprego e a perda do poder aquisitivo da população, como aponta Sandro Silva supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Ele esclarece que a simples propagação dos números – sem levar em consideração a complexidade do cálculo e o público pesquisado – pode levar ao erro de avaliação. O histórico recente deve ser considerado. “A inflação teve um significativo aumento em 2015 e 2016, um acumulado de 17,65% em dois anos. Aliado a isso agravou-se a crise econômica que atingiu o mercado, causou redução dos empregos formais e aumento do desemprego. Um histórico danoso ao trabalhador”, afirma Sandro.

Preços ao consumidor

Em contrapartida à baixa dos preços dos alimentos e bebidas (queda de 2,48% nos últimos 12 meses no INPC), outros grupos tiveram alta pressionando o chamado “custo de vida”. Na educação o aumento foi de 7,16% puxado pelas mensalidades e materiais, na saúde de 5,17% por causa dos planos de saúde e na habitação de 4,56%, com gastos com aluguel, energia elétrica e consumo de água. No IPCA não foi diferente. A baixa foi puxada pelo preço dos alimentos e bebidas, representando cerca de 25% do indicador e deflação de 0,94%. Em contrapartida, os gastos médios com a categoria de transportes subiu 1,25%, puxado sobretudo pelos gastos com combustíveis, que avançaram 3,43%.

Na hora das compras, o consumidor não tem sentido a inflação em queda.

“No bolso não estamos sentido isso [queda da inflação]. Não vejo isso, meus custos só continuam subindo mês a mês. Não tem milagre. Não dá para acreditar nisso. Nos mercados menores, mais periféricos, até tem tido uma diferença nos preços, mas nos supermercados os preços seguem só aumentando”, aponta o comerciante Edson Roberto Rocha.

Complexidade

Vários fatores devem ser considerados no calculo da inflação. O índice se refere a uma média de consumo de um público específico. No caso do INPC, o público da pesquisa é a população que recebe entre 1 e 5 salários mínimos. Já o IPCA abrange as famílias com rendimentos mensais compreendidos entre 1 e 40 salários mínimos. Outro fator a ser avaliado é o comportamento distinto da cada região da pesquisa. O INPC é uma média nacional dos preços aferidos em 11 capitais.

Atualmente, o INPC considera 382 itens para pesquisa, entre alimentação, transporte, vestuário, telecomunicações, entre outros. É feita uma média de todos os itens pesquisados e em todos os locais pesquisados. No cálculo, Curitiba tem peso de 7,29%. Por exemplo: em agosto, o INPC foi de 0,03% negativos, mas, na capital paranaense, a variação foi de 0,35% positivo; no acumulado dos últimos 12 meses, a média nacional foi 1,73%, mas, em Curitiba, a variação foi de 2,15%. Em Recife, por exemplo, a variação foi de 4,11%.

Antes de comemorar números, a população precisa entender o custo benefício desta matemática da inflação. “Duas questões devem ser consideradas quando falamos de inflação: uma questão são os preços e outra é a renda dos pesquisados. Por mais que a inflação esteja baixa, os indicativos apontam perda do poder aquisitivo da população desde 2015. É preciso considerar todo esse conjunto de fatores O simples cálculo da inflação é limitado”, aponta Sandro Silva, acrescentando que os indicadores não apontam uma retomada consciente da economia.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/Fotos Públicas