Foto: Leandro Taques

A Primavera Secundarista, movimento que surgiu da insatisfação de estudantes com medidas do governo Michel Temer (PMDB) como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55 que congelou investimentos públicos para os próximos 20 anos e a Medida Provisória (MP) de reforma do ensino médio, completa um ano neste mês.

Em outubro de 2016, estudantes fizeram das escolas o principal instrumento de enfrentamento contra os ataques do governo. Durante semanas eles dormiram nas escolas, fizeram suas próprias refeições, coordenaram debates, oficinas, rodas de conversas, aulas públicas, atividades culturais e de autogestão, sem descuidar do ambiente escolar. Enfrentaram direções de colégios contrárias, arbitrariedade da polícia militar e pressão de parte da sociedade que se move conforme as opiniões da mídia dominante.

O Paraná, estado que mais concentrou ocupações (mais de 800 instituições), teve a reação mais violenta com ação de milicianos do Movimento Brasil Livre (MBL) que forçavam desocupações, invadiram escolas ocupadas, agrediram e assediaram secundaristas. Por conta do tempo e retaliações, as ocupações foram perdendo força. Apesar de toda a resistência, a PEC 55 foi aprovada, os royalities do pré-sal, que seriam destinados para a educação foram abertos para o capital estrangeiro, e a reforma do ensino médio acabou aprovada sem debate algum no início de 2017.

As ocupações serviram para aumentar a bagagem de luta dos estudantes e prepará-los para lutas do movimento estudantil que seguem em pauta. Passado um ano, os estudantes recordam do episódio que consideram um marco histórico de reorganização dos secundaristas no país. Hoje, a pauta do movimento inclui o fechamento de turmas e escolas, a luta contra propostas que visam restringir o debate político no ambiente escolar – como a “Escola sem partido” e as denúncias de má administração dos recursos públicos da educação.

Para tanto, secundaristas organizarão atos e intervenções culturais em Curitiba nas próximas semanas para relembrar um ano da Primavera Secundarista. O objetivo é mostrar que o movimento estudantil segue em estado de alerta contra os ataques dos governos de Temer e do tucano Beto Richa. “Hoje seguimos com nossas pautas contra o sucateamento da educação. Temos fechamentos de turmas, cancelamento de aulas de artes, de espanhol. Mais que criticar governos, queremos apresentar alternativas, mostrar que educação queremos”, diz Oruê Brasileiro, estudante do Colégio Estadual do Paraná (CEP) e integrante do Coletivo Autônomo de Organização Secundarista (Caos), que participou das ocupações em 2016.

Assembleia estudantil realizada no último fim de semana. Foto: Julio Carignano

No interior do Paraná as ocupações também serão relembradas. Em Cascavel, no Oeste do Paraná, grêmios estudantis farão um encontro chamado “O Renascer da Primavera”. Segundo Stefany Kovalski, presidente da Associação Cascavelense de Estudantes Secundaristas (ACES), as ocupações mostraram que os estudantes pensam por si, que tem senso crítico. “Infelizmente fomos ignorados pelo governo que aprovou a PEC 55, que aprovou a reforma do ensino médio. Fizemos das ocupações um espaço de cidadania, mostrando para os estudantes que a escola não precisa ser metódica, que ela pode ser livre, de amplo espaço de diálogo dos estudantes”, afirma a secundarista, acrescentando que o ensino médio precisa de uma reforma que não retire o senso crítico dos estudantes.

Para Stefany, que participou das ocupações no Colégio Santos Dumont, a Primavera Secundarista resultou em flores que continuam a pauta do movimento estudantil. “Ela floresceu pautas que seguem em debate, como de uma escola com respeito ao gênero, uma escola sem machismo, racismo e LGBTfobia”.

Helbert Marcos, da União Paranaense dos Estudantes Secundaristas (UPES), traz ao debate outras pautas do movimento estudantil, como a luta contra a redução da maioria penal de 18 para 16 anos. Na opinião da entidade, reduzir a maioridade é tratar o efeito e não a causa. A medida, de acordo com o movimento estudantil, é uma forma do governo isentar-se do compromisso com a população. Dados da Unicef mostram que menos de 1% dos crimes hediondos são cometidos por jovens e cerca de 82 são mortos diariamente no Brasil.

A Operação Quadro Negro, responsável por investigar o desvio de milhões de reais na construção de escolas e má administração de recursos públicos no sistema educacional pelo governo Beto Richa também deve estar em pauta nos atos e intervenções programadas para o mês de outubro.

Educação aniquilada

O sucateamento da educação por parte do governo Temer teve três frentes. Começou pela PEC 241 (que depois se transformou em PEC 55), medida de austeridade que congelou os recursos primordialmente em duas áreas: saúde e educação. Depois por conta da alteração da metodologia na partilha do pré-sal que resultou na perda de recursos que eram destinados à educação e, por fim, a reforma do ensino médio, que já apresenta resultados como a redução do número de estudantes e de turmas.

Entre as principais alterações da reforma estão a criação de um currículo flexível, o aluno escolhe qual das cinco áreas seguir: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Formação Técnica e Profissional; se tornam obrigatórias apenas Matemática, Língua Portuguesa e Língua Inglesa, durante todo o curso (que continua com três anos); Educação Física se torna facultativa; o “Notório saber”, e não mais formação específica, já basta para que se possa lecionar; e o aumento da carga horária de 800 anuais (4 horas por dia) para 1.000 anuais (5 horas por dia).

Segundo especialistas, ao implementar o ensino médio integral, o governo desconsidera a realidade de desigualdade social do Brasil. Muitos jovens precisam trabalhar para complementar a renda familiar. Os contrários à proposta ressaltam que a reforma aumenta a desigualdade entre escolas, já que unidades não são obrigadas a disponibilizarem as cinco áreas de conhecimento, forçando a formação técnica para os alunos de perfil socioeconômico mais baixo. Outro ponto de crítica é a ausência de matérias não mais obrigatórias e com perfil mais crítico; como filosofia e sociologia.

Foto: Leandro Taques