Foto: Leandro Taques

Sábado, 28 de outubro de 2017. Manhã ensolarada na Ru XV de Novembro, ponto turístico de Curitiba. Já passava das 11h e minha aula prática de fotografia estava terminando. De repente, na altura do “monumento” da Boca Maldita, uma agitação incomum. Gritos, correria e um cidadão agride outro. Um soco, alguns chutes e o homem no chão imobilizado, enquanto ouvia gritos do seu agressor. “Você agrediu meu filho de cinco anos, seu lixo. Vai para a cadeia”, enquanto tinha seu braço torcido e um joelho que afundava suas costas. “Chama a polícia, chama a polícia. Seu lixo, meu filho tem cinco anos, seu lixo”.

Gente se aglomerando e nada da polícia. O cidadão imobilizado estava nitidamente alterado. Talvez embriagado, quem sabe algum problema mental. Era um homem magro, fraco. Roupas sujas, cabelo sujo, rosto sujo. Um marginalizado. O homem que o imobilizou disse que ele agrediu o filho de apenas cinco ano. Ainda não sou pai, mas serei nos próximos dias. Creio ser natural uma reação dessa natureza diante de uma violência contra um filho e contra uma criança.

Mas o absurdo se dá em seguida. A Guarda Municipal demorou, ao menos, dez minutos para chegar e simplesmente assumir o posto do pai que tinha imobilizado o cidadão. A Polícia Militar, que ao longo da manhã desfilava pelo calçadão da Rua XV com seus carros e fuzis, demorou mais um tanto. E a turba começava a se manifestar. “Esse cara agride mulher”. “Esse filho da puta tem que morrer”.  “O que aconteceu? O que? Sério? Tem que matar esse lixo”. Gritos em sequência e encavalados. Uns mais ousados chutam o homem imobilizado no chão.

Foto: Leandro Taques

“Tá com dó? Leva pra casa esse filho da puta”. “Esse cara vive agredindo as pessoas, tem que matar”. “Aí filho da puta, vai ver o que é bom lá na cadeia”. A PM chega. Substitui a Guarda Municipal e o homem segue ali, imobilizado. Sendo julgado e condenado. Por que não levam esse infeliz dai, eu me perguntava.

“De onde vem esses lixos?” “Esses ônibus que trazem”. “Ah, eles vêm de São Paulo”. “Tem que morrer mesmo. Nem prendam, um pipoco na cabeça e tá resolvido”. O homem já estava imobilizado há mais de 15 minutos e os justiceiros se revezavam nas condenações.  Eis que sem a menor necessidade um policial pisa na cabeça do homem.

Já estava registrando a cena, naturalmente segui fotografando, me agachei.”Ah, tá aí o direitos humanos fotografando. Leva pra casa. Direitos Humanos, leva pra casa”, ouvi. Olhei bem nos olhos do acusador e simplesmente o ignorei. Mais discussão, mais braço torcido, mais acusações e, finalmente, a PM levanta e carrega o homem para a viatura.

Antes que venham me acusar de “tolerante”, o ponto não é esse. Vivemos numa sociedade onde há regras, há leis. Se o homem agrediu uma criança, o que é inadmissível, que seja submetido ao rigor que a lei o reserva. O que não posso concordar, nem admitir, é uma turba de justiceiros e um Estado violento e despreparado. Todos em um manicômio.