Ameaça de despejo mobiliza 430 famílias do MST no norte do Paraná

Enquanto luta por assentamento, comunidade Maila Sabrina cultiva área de 7 mil hectares





Educandos ajudam na organização da escola itinerante. Foto: Wellington Lenon

A fazenda Brasileira, área de 10,5 mil hectares nos municípios de Faxinal e Ortigueira, no norte do Paraná, está ocupada desde 2003 por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). No local, cerca de 430 famílias constituíram o acampamento Maila Sabrina, comunidade que por meio da autogestão criou infraestrutura, espaço de convivência e cultiva agricultura diversificada e pecuária, contribuindo há anos para o desenvolvimento regional, aquecimento do comércio local e arrecadação dos municípios.

Toda essa produção está ameaçada por uma eventual reintegração de posse autorizada pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), o que acarretará no despejo de uma população estimada de duas mil pessoas, entre crianças, jovens, adultos e idosos. “As famílias estão produzindo há quase 15 anos na área, além de terem construído toda estrutura para atendimento da saúde e educação. É uma área que já tem totais condições de se constituir em assentamento. Essa é a nossa luta”, comenta José Damasceno, da coordenação estadual do MST no Paraná.

Damasceno lembra que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já fez três ofertas aos proprietários da área, a família Petrilli. Apesar do interesse em vender a fazenda, os Petrilli em 2008 pediram intervenção federal na situação; pedido esse acatado pelo STJ que autorizou o despejo. “A saída é pela negociação, basta sensibilidade do governo federal e do proprietário. O dano de um despejo na área será irreparável, seria um verdadeiro estrago humano”, comenta o coordenador do MST.

A operação policial estaria sendo preparada nas últimas semanas. Conforme relatos dos acampados, helicópteros tem sobrevoado a fazenda nos últimos dias e a Polícia Militar já teria feito estudos sobre a logística e mapeamento do local junto às prefeituras. Apesar disso, o assessor de Assuntos Fundiários do Governo do Paraná, Hamilton Serighelli, afirma que a reintegração está temporariamente suspensa, pois o Incra e governo estariam novamente em negociação com os proprietários.

Junto às tratativas de oferta pela área, a assessoria jurídica do MST está encaminhando medidas jurídicas para reverter a decisão que concedeu o despejo na fazenda. “Durante vários anos o proprietário ofertou a fazenda, mas havia discordância em relação ao valor da avaliação feita pelo Incra. Estamos fazendo tratativas com o Incra junto às medidas jurídicas”, comenta Humberto Boaventura, advogado que acompanha a situação.

Estrutura e auto gestão

Nos últimos 14 anos, a comunidade Maila Sabrina organizou toda a infraestrutura do acampamento que conta com borracharia, açougue, bar, unidade de saúde, mercado, além de equipamentos de lazer como campo de futebol e um centro de convivência comunitário.

Para assegurar o direito à educação, os sem terra fizeram um mutirão para constuir a escola itinerante Caminhos do Saber, que engloba todas as etapas da educação básica. Ela começou a ser organizada no fim de 2005, em parceria com a Secretaria Estadual de Educação. Hoje ela atende cerca de 200 educandos e emprega 20 professores e três funcionários. Anteriormente as crianças tinham que percorrer 40 quilômetros diários para estudar em uma escola em outra comunidade rural.

Dos 10,5 mil hectares da fazenda, 7 mil são cultivados com agricultura e pecuária. Na área os camponeses produzem soja, milho, feijão, trigo, arroz, legumes, hortaliças e frutas para comercialização. Cada família, em seus lotes, produz diversidade para autoconsumo e cria animais de pequeno porte. A comunidade gerou renda e investiu em maquinários. Ela conta com 28 tratores, 10 colheitadeiras, 12 caminhões e outros implementos agrícolas, contribuindo para desenvolvimento da economia regional, contribuindo para arrecadação de impostos nos municípios e no estado.

Sem terra cultivam 7 mil hectares de um total de 10,5 mil hectares da fazenda. Foto: Wellington Lenon
Comunidade Maila Sabrina. Foto: Wellington Lenon