Todas contra 18: Mulheres dizem NÃO à criminalização do aborto

Manifestantes chamaram a atenção para os retrocessos e as ameaças aos direitos das mulheres





Foto: Oruê Brasileiro

Mulheres de diversas cidades do país foram às ruas nesta segunda-feira (13) em protesto contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 181/2015, que pode abrir a possibilidade da proibição de todas as formas de aborto, inclusive nos casos hoje considerados legais, como a interrupção de gravidez fruto de estupro e de comprovação de fetos anencéfalos. A proposta poderá colocar o Brasil na condição de uma das legislações sobre aborto mais restritivas do mundo.

A PEC foi aprovada em Comissão Especial da Câmara de Deputados no dia 8 de novembro com 18 votos a favor e apenas um contrário. Ela ainda será votada em plenário e, para ser aprovada nessa fase, é necessário obter no mínimo 308 votos a favor. A proposta foi apelidada de “Cavalo de Troia” por inicialmente tratar somente da ampliação da licença-maternidade para mães com bebês prematuros. No entanto, o relator da proposta, deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP) modificou o projeto, definindo que a vida começa “desde a concepção” e não somente após o nascimento.

Em Curitiba, cerca de 500 pessoas participaram de um ato e saíram em marcha pelas ruas da capital paranaense. A mobilização reuniu vários coletivos e grupos de luta. A concentração aconteceu na praça da Mulher Nua e foi concluída na rua XV de Novembro, ponto tradicional de manifestações. Com cartazes e palavras de ordem, as manifestantes chamaram a atenção para os retrocessos e as ameaças constantes do Congresso Nacional aos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres.

Marina Alzão Felisberto, professora da educação infantil, lembra que Curitiba que é a segunda cidade que mais aborta no país. “Como diz uma das palavras de ordem do ato, lugar de estuprador não é na certidão! Afinal com a criminalização do aborto em casos de estupro, quem dará assistência para essas mulheres – muitas vezes crianças e adolescentes – quem dará assistência para a criança que nascerá? Como essa mulher se sentirá cada vez que vir a criança que teve “origem” em um ato de violência?”, questiona.

Participante do ato, Marina ressalta que o aborto precisa ser tratado como uma política pública de saúde – da criança e para a mulher – e não como um ideal moralista e religioso. “Essa pauta deve ser vista como uma questão de política pública para as mulheres que tem o direito à vida e ao acolhimento pelo Estado quando são estupradas”.

Marcha pelas ruas da capital paranaense. Foto: Oruê Brasileiro

Londrina

Em Londrina, no norte do Paraná, cerca de 100 pessoas estiveram presentes na manifestação organizada pelo Coletivo de Mulheres Contra a PEC 181. O ato aconteceu no calçadão, onde foram distribuídos materiais sobre a PEC para as pessoas que passavam pelo local e, posteriormente, as manifestantes saíram em marcha até o Canto do Movimento dos Artistas de Rua de Londrina (MARL). Por lá foi organizado uma roda de debate e exibição de um documentário sobre o tema.

“Vivemos em uma sociedade machista que nos ensina desde cedo a aceitar que sejamos as mulheres submissas, e que fiquemos longe das decisões políticas. Não por acaso, a PEC 181 foi aprovada por 18 homens na comissão da Câmara dos Deputados. Mas acreditamos que a cada dia mais mulheres estejam entendendo o quanto esse sistema nos oprime, acreditamos que a cada dia mais mulheres estejam buscando lutar pelos nossos direitos. Esses direitos foram conquistados pelas mulheres com muita luta e agora querer nos tirar. Não iremos aceitar”, comenta Nayara Damião, que participou do ato em Londrina.

Outras ameaças

O movimento feminista reforça que propostas como a PEC 181 buscam impedir qualquer avanço da pauta da legalização do aborto no Brasil e até mesmo retroceder a legislação atual. Além da PEC 181, outros projetos em discussão no Congresso ameaçam o direito ao aborto, entre eles o “Estatuto do Nascituro” (PL 478/2007) e PL 5069/13. Outras PECs de teor similar como a PEC 164/2012, de autoria de Eduardo Cunha e PEC 29/2015, de autoria do senador Magno Malta (PR/ES), definem “a vida como inviolável desde a concepção”.

Números

A Pesquisa Nacional de Aborto 2016, realizada pelo Anis Instituto de Bioética e pela Universidade de Brasília (UnB), aponta que uma em cada cinco mulheres aos 40 anos terá abortado ao menos uma vez.

De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), divulgados no final de setembro, em todo o mundo foram registrados 55,7 milhões de abortos de 2010 a 2014. Os países em desenvolvimento, conforme o levantamento, concentraram 97% (24,3 milhões) dos 25,1 milhões de abortos inseguros. Na América Latina, somente quatro dos 21 países permitem o aborto na rede pública de saúde: Chile, Uruguai, Guiana e México.

Segundo dados divulgados no fim de outubro, pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil registrou em média, no ano passado, 135 estupros por dia. Foram 49.497 casos no total, 4,3% a mais que o ano anterior. De acordo com o censo do Senado Federal, a cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. São 130 mulheres por dia. Ainda conforme a pesquisa, 80% das vítimas são crianças ou adolescentes com menos de 16 anos.