Os deuses que aceitamos

A religiosidade nórdica é aceita e consumida pela maioria das pessoas. Mas a afro-brasileira geralmente é insuportável por esses mesmos





Léo Silva*

Na última semana do mês de outubro estreiou nos cinemas “Thor: Ragnarok”. Terceiro filme do herói que integra o tão afamado grupo dos Vingadores. Thor faz parte da mitologia nórdica. Religiosidade professada nos países da Dinamarca, Noruega e Suécia e amplamente difundida durante a Era Viking. Filho de Odin, ele é o deus representante dos trovões. Tem como ferramenta principal seu martelo, com cabo curto e cabeça bem grande e que sempre retorna para suas mãos. Seu pai é o deus principal da crença, o pai de todos.

Thor e seus parceiros têm a missão de deter Hela e evitar o Ragnarok. Hela, também faz parte da mitologia, a deusa dos mortos. Nesta produção ele terá também a companhia de Valquíria, uma representação de entidades femininas responsáveis por levar os mortos honrados até Valhala (espécie de céu). Loki, deus da trapaça, que já participou dos outros filmes do vingador.

Durante a sua exibição certamente o filme terá milhões de espectadores por todo o mundo e também pelo Brasil. Adultos e crianças de todas as crenças e religiões. Pais que possivelmente já compraram roupas do herói. Meninos e meninas que têm brinquedos, materiais escolares e decoração nos quartos com o tema do deus dos raios.

Mas já pensou se no lugar de Thor a estrela fosse Xangô? Sim Xangô o orixá dos raios, assim como é Thor, com seu machado, assim como Thor tem seu martelo. Rodeado de outras entidades míticas como Oxalá, Ogum, Iemanjá. Em enredo com atos heroicos, batalhas épicas, reviravoltas emocionantes e uma liberdade poética como é comum no mercado de entretenimento. Será que a recepção de nós brasileiro seria igual ou no mínimo positiva?

As histórias de Thor tem igual cunho religioso como as de Xangô. Ambos são deuses (ou orixás) envoltos de outros deuses, cada um com uma característica. Mas acredito que uma substituição dessas seria suficiente para inúmeras pessoas começarem a lerem suas cartilhas de críticas preconceituosas. A religiosidade nórdica é aceita e consumida pela maioria das pessoas. Mas a afro-brasileira geralmente é insuportável por esses mesmos.

Dentro da cultura do entretenimento temos séries como famosas “Vikings”. Que traz rituais, sacrifícios e representações divinas. Mas noticiários temos Traficantes Evangélicos (ou evangelizados) obrigando sacerdotes de religiões afro a quebrarem seus objetos de culto.

Vej, leitor, Mão quero substituir Thor por Xangô. Nem retirar do nosso convívio outras culturas, apenas questiono nossa capacidade de absorver aquilo que é afro. Existe uma dificuldade de se exercer o respeito dentro da nossa sociedade. Lógico se você não quer que seus filhos consumam esses conteúdos, ninguém te obriga. Mas vale o questionamento: Por que temos o Thor escancarado nas nossas telas e Xangô não?

Outras culturas, inclusive as religiosas, não são como vírus que vão entrar em nosso organismo e mudar nossas crenças. É possível conhecer e respeitar sem se converter. Thor é a prova disso. Precisamos pensar com calma nessas questões sem aquela ânsia de se ter uma opinião crítica e fazer com que as pessoas a aceitem. Teremos uma vida mais rica conhecendo as várias culturas pelo mundo. Não precisamos provar sempre que a nossa é melhor. Será maravilhoso o dia em que vamos conseguir receber todas as culturas de maneira positiva.

*Léo Silva é publicitário, capoeirista e atua na QuemTV Produções