Crônica: Democracia pulsa em Porto Alegre

Nas ruas, o que se vê é que a multidão vibra independente das decisões





Foto: Leandro Taques

Há pelo menos duas horas às ruas próximas à Esquina Democrática estavam tomadas. A multidão aguardava a fala de Lula enquanto os demais políticos discursam repetitivamente. Encostado em um caminhão de som, de repente volto a atenção para o semáforo que histericamente muda de cor. O vermelho pisca e se fixa no alto. O sinal para pedestres abre e conta regressivamente vinte segundos. Mas a maioria não se move. Apenas um ou outro que transita sem linha definida em busca do melhor ângulo de foto, de um pequeno metro quadrado menos apertado. Mais uns instantes e o semáforo dá preferência aos carros. É sinal verde. Mas automóveis não passam no local. As ruas foram tomadas pelo povo. O que se move são as bandeiras vermelhas e a compreensão das pessoas de que fazem parte de um momento histórico de nossa nação.

A democracia pulsa nas ruas de Porto Alegre poucas horas antes que alguns togados possam querer cortar-lhes os pulsos,  promovendo a eutanásia do desejo dos trabalhadores brasileiros. E em cada rosto que miro, homem, mulher, jovem, negra, sinto a satisfação pessoal de estar aqui. Contraste imenso com as pessoas que destilam o ódio escondidas atrás do touch screen de seus celulares. A cada camiseta que leio, enxergo o quanto se tem de luta por fazer e o quanto essas pessoas passam a entender que não existe causa superior ou inferior a outra, mas apenas diferente.

Enquanto penso nisso, abaixo a cabeça. Dos microfones, a cantora entoa “A esperança equilibrista”. Uma moça ao meu lado acompanha apaixonadamente e eu sou transportado para a Ditadura Militar, para todas as outros tentativas de golpe dadas em nosso país. “Que sufoco”, explode das gargantas enquanto reprimo a lágrima que apenas quer expressar a felicidade de estar cobrindo um ato político que pode alterar completamente os rumos da nação.

Pela última vez olho para a histeria do semáforo amarelo e sorrio em sua direção. Entendo que embora ele queira ditar as regras, nos dizer quem pode ir, quem deve ficar e quando se deve partir, essa gente pulsa de “rebeldia”. Essa gente diz que não lhes colocarão algemas no direito de votar.

Por hora, a democracia respira com os punhos cerrados e firmes. Que assim prossiga.