Votação do Escola Sem Partido é novamente adiada na CCJ

Conhecida como "Lei da Mordaça", proposta foi debatida nesta terça-feira (20) na Assembleia Legislativa do Paraná





Reunião da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa. Foto: Pedro Oliveira/Alep

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) voltou a debater nesta terça-feira (20) o Projeto de Lei 606/2016, que busca instituir o programa “Escola Sem Partido” no âmbito do Sistema Estadual de Ensino. Apresentada originalmente pelo deputado Missionário Ricardo Arruda (PEN), a proposta também conhecida como “Lei da Mordaça”, recebeu um substitutivo do deputado Pastor Edson Praczyk (PRB), relator do PL.

Durante os debates na comissão, os deputados Luiz Claudio Romanelli (PSB), Nereu Moura (MDB) e Péricles de Mello (PT) pediram vistas ao PL, adiando novamente sua votação. Eles declararam a inconstitucionalidade da proposta e argumentaram que ele visa impedir o pluralismo de ideias, cercear o trabalho dos educadores e negar a possibilidade de ampla aprendizagem. Em outubro do ano passado, a proposta já tinha recebido um pedido de vistas na CCJ.

Os parlamentares citaram que o PL viola o princípio de “separação de poderes”, cabendo somente a União legislar sobre as diretrizes base da educação. Romanelli citou que a alegada “neutralidade política, ideológica e religiosa”, defendida pelo autor da proposta, já está prevista nas constituições Federal e Estadual. “Além de vício de iniciativa, este projeto fere princípios constitucionais. Já existe lei que proíbe propaganda partidária em escolas”, apontou.

A liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), concedida pelo ministro Luís Roberto Barroso, que suspendeu lei similar em Alagoas também foi apresentada pelos deputados. Promulgada pela Assembleia Legislativa de Alagoas, a lei determinava a “neutralidade” de professores e previa punição a quem manifestasse opinião que “induziria” ao “pensamento único” de alunos em sala de aula.

Para Péricles de Melo, o programa Escola Sem Partido pode promover o inverso do que realmente prega: a discriminação e perseguição dos que dele divergem. “Ao invés de promover os direitos humanos, igualdade e combate a qualquer forma de discriminação, ele se apresenta como uma proposta de postura totalitária. Não se pode proibir que um professor discuta determinado tema em sala de aula”, argumentou. Para o petista, o programa vai contra a busca de uma escola inclusiva. “A proposta tem flagrante autoritarismo. O discurso da tal ‘ideologia de gênero’ neste caso não passa de sofismo”, afirmou Péricles.

Durante a sessão da CCJ foram lidos pareceres de entidades que já se posicionaram contra o projeto Escola Sem Partido; entre eles a Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), Ministério da Educação (MEC), Defensoria Pública do Paraná, Conselho Estadual de Educação (CEE-PR), Conselho Universitário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

“Foro de São Paulo”

Autor do projeto, o deputado Missionário Arruda discursou no plenário contra mais um pedido de vistas. Alegando que a ideologia de gênero quer desvirtuar os valores da família, Arruda afirmou que o adiamento é algo orquestrado pela “esquerda petista”. Ele citou o Foro de São Paulo, o comunismo, a Venezuela e Cuba para defender seu projeto. “Tudo começou no Foro de São Paulo, quando mudou-se os livros didáticos das escolas e faculdades. Pesquisas dizem que 90% dos livros das universidades são de autores de esquerda”, disse o deputado, sem citar a que pesquisa se refere.

Missionário Arruda afirmou ainda que a ideologia de gênero é uma “prática do mal” com o intuito de “confundir as crianças”. “Querem obrigar nas escolas que um menino vista batom e use saia”, acrescentou.

Em resposta ao autor do PL, o deputado Professor Lemos (PT) defendeu o arquivamento do projeto Escola sem Partido. “Este projeto faz mal à educação, acaba com a diversidade e com a pluralidade no ambiente escolar. É um projeto opressor”, declarou.

Derrotas

O programa Escola Sem Partido, que propõe combater uma suposta “doutrinação política e ideológica” nas escolas, vem sofrendo sucessivas derrotas em todas as esferas. Decisões recentes tem apontado a inconstitucionalidade da proposta e liminares têm derrubado legislações já aprovadas, como a lei estadual de Alagoas, ou leis municipais como em Jundiaí (SP) e Paranaguá (PR).

Em algumas casas legislativas, os projetos sequer são levados ao plenário ao receberem pareceres contrários em comissões internas, como a exemplo da Assembleia Legislativa de São Paulo e da Câmara Municipal de Belo Horizonte (MG).

No Senado, o Escola Sem Partido teve duas derrotas recentes. Em dezembro de 2017, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação rejeitou a “sugestão legislativa” que pretendia retirar o título de patrono da educação do educador Paulo Freire. Enquanto isso, o autor do projeto, senador Magno Malta (PR/ES), retirou de tramitação a proposição que buscava incluir o programa nas bases da educação nacional.

O mais recente revés do Escola Sem Partido aconteceu no dia 14 de fevereiro na Câmara de Vereadores de Cascavel, no Oeste do Paraná. A proposta de legislação municipal, sugerida por parlamentares ligados a bancadas evangélicas, foi arquivada após receber pareceres contrários de três comissões da casa legislativa.