Indígenas acusados de cortarem bambu são colocados em liberdade

Os cinco guarani tinham sido presos na quarta-feira (14) após cortarem um bambu de um refúgio biológico da Itaipu





Indígenas e advogados de defesa após a audiência de custódia na Justiça Federal de Foz do Iguaçu. Foto: Marcos Labanca/H2Foz/Arquivo

Os cinco indígenas Avá-Guarani presos na quarta-feira (14) após cortarem um bambu em um refúgio biológico da Itaipu Binacional, em Santa Helena, a 120 quilômetros de Foz do Iguaçu, foram colocados em liberdade na tarde desta sexta-feira (16). A fiança de R$ 5 mil  arbitrada pelo delegado também foi suspensa na audiência de custódia na Justiça Federal de Foz do Iguaçu.

No despacho, o juiz Edilberto Clementino determina que os Guarani devem comparecer à Justiça ou a Polícia Federal sempre que necessário. Também não poderão sair da aldeia sem autorização prévia da justiça. Com a decisão, os indígenas responderão o processo em liberdade.

Os Guarani tinham sido presos pela Polícia Ambiental do Paraná nas imediações do Parque Nacional do Iguaçu sob acusação da suposta prática de danificar vegetação nativa em um refúgio biológico de preservação ambiental da Itaipu Binacional. Eles cortaram um bambu nativo, chamado popularmente de “taquara”, comum para a confecção de artesanatos e construção de moradias em aldeias.

O grupo voltava de uma ilha às margens do Lago de Itaipu quando foram abordados pelos policiais militares e encaminhados à sede da Polícia Federal de Foz do Iguaçu, onde permaneceram detidos até a manhã desta sexta-feira (16). Dentre os presos estava Cláudio Vogado, cacique da comunidade Guarani.

O crime cometido, segundo a Polícia Ambiental, está previsto no Artigo 38, da Lei 9.605 do Meio Ambiente: “destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração”. Após serem ouvidos, o delegado de plantão arbitrou fianças de R$ 1 mil para cada indígena detido para obtenção da liberdade provisória.

Para o advogado Hernan Aguillera, do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) de Foz do Iguaçu, que fez a defesa dos indígenas com o colega Ian Martin Vargas, a suspensão da fiança e a liberdade dos Guarani é vitória do estado democrático de direito. “Foi uma prisão que gerou revolta, pois alguns indiciados sequer tinham calçados. A fiança arbitrada era a certeza de quem ficariam em cárcere”, destacou.

A prisão causou manifestações de órgãos indigenistas como a Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpin), que por meio de nota, repudiou a atitude da Polícia Ambiental. “Não dá pra aceitar tamanho absurdo já que quem realmente quem cometeu um crime ambiental irreparável foi a própria Itaipu. E agora fazer isso com os Povos Indígenas é inaceitável pois sempre tiveram essa relação estreita e respeitosa com o meio ambiente, sobretudo, historicamente em seus territórios nesta região”, apresenta o documento.

Retomada – O território em questão, às margens do Lago de Itaipu, foi retomado pela comunidade Guarani em janeiro de 2017, depois de 35 anos de expulsão. O local, denominado Tekoha Mokoi Joegua, era uma aldeia habitada por diversas famílias Guarani que foram expulsas pela Itaipu Binacional em 1982, quando fechou as comportas da maior represa do mundo.

Os Guarani nunca foram indenizados e sequer ouvidos. A área está em litígio, já que em 2017, o Juiz Federal de Foz Iguaçu concedeu dois anos de prazo para que a Funai regularize a terra. A retomada deste território foi considerada um ato simbólico diante da dívida histórica que a Itaipu Binacional tem com os povos Guarani.

Estima-se que na região de usina existiam ao menos 32 aldeias, conforme estudos da antropóloga Malu Brant. Elas desapareceram entre 1940 e 1982, período entre a criação do Parque Nacional do Iguaçu e o alagamento para formação do lago de Itaipu. Pelo menos nove dessas aldeias foram alagadas com a construção, de acordo com levantamento feito pela estudiosa a pedido da Justiça Federal de Foz do Iguaçu.

Por meio de uma nota, a Itaipu Binacional afirmou que o refúgio é uma área de preservação permanente criada após a formação do reservatório, em 1982, e não se trata de “terra indígena”.