Avatar de Vitor Teixeira. Um pato, figura muito utilizada por ele em suas charges. Ilustração: Vitor Teixeira

Por Gibran Mendes e Júlio Carignano

As jornadas de junho de 2013 que ainda repercutem no Brasil, sem uma leitura definitiva sobre o que aconteceu exatamente naqueles dias, foram o ponto de partida para o trabalho de Vitor Teixeira começar a ganhar destaque. O chargista, de 31 anos, que mora em São Paulo, iniciou naquele momento a divulgar suas ilustrações com viés político nas mídias sociais.

Passados quase cinco anos, Vitor Teixeira virou uma referência quando o assunto são charges e ilustrações. Com um tom extremamente ácido, mirando na direita e até mesmo em setores ditos “progressistas”, o artista não foge de uma polêmica. “Galera pede autocrítica mas odeia ser criticada”, disse em entrevista ao Porém.net. “Gosto dos desenhos que geram polêmicas. Polêmica é bom, gera embate e esclarece muita gente”, completa.

Crítica dura ao poder judiciário. Ilustração: Vitor Teixeira

O artista também evita divulgar fotos suas. O motivo? Ameaças recorrentes contra si e até mesmo a sua família. As polêmicas geradas a partir de suas artes garantiram inimizades e até inimigos famosos, como quando em 2015, recebeu uma notificação extrajudicial da Igreja Universal do Reino de Deus que pedia que ele excluísse sua página.

Na entrevista, Vitor fala sobre o uso de mídias sociais para divulgação do seu trabalho, sobre polêmicas, sobre produzir conteúdo à esquerda e de como aos poucos foi perdendo o entusiasmo em criticar João Dória, que segundo ele, está “se enterrando politicamente”.

Confira a íntegra da entrevista.

Porém.net:  Você começou, efetivamente, a ganhar notoriedade a partir de junho de 2013. Como você avalia esse movimento hoje e o quanto ele foi importante para o teu trabalho?

Vitor Teixeira: Junho foi uma espécie de impulso. Aproveitei o desenvolvimento dos acontecimentos e seu reflexo nas redes e comecei a publicar alguns desenhos, ainda bem confuso sobre minhas intenções. As primeiras charges tinham um viés bem panfletário, influenciadas pelo momento político e em certa medida pelo público alcançado, característica que foi se modificando com o tempo.

As fases do golpe. Ilustração: Vitor Teixeira

Porém.net  Seu traço e as críticas que ele carrega parecem ser muito mais provocativos, até agressivos, do que aparenta ser a tua personalidade no dia-a-dia. É isso mesmo?

VT: Acho que sim. Sou mais xingado na internet do que na vida real. Mas também sou xingado na vida real, então não sei ao certo.

Porém.net:  Você é um crítico de segmentos e partidos que se dizem à esquerda ou ao menos progressistas. Não raro o PSOL, Mídia Ninja e outros perfis do Facebook, como o Quebrando Tabu, entram na tua mira. Essa é uma característica da tua arte? Como você enfrenta as críticas destes setores?

Charge critica ofensiva contra funkeiro por conta de música com trecho machista. Até a prisão do músico foi demandada. Ilustração: Vitor Teixeira

VT: Essas organizações que você citou elogiavam meu trabalho até o momento em que viraram alvo de questionamentos. Esse coxinha do Quebrando o Tabu “printava” meu perfil pessoal e usava como conteúdo na página dele, “mó doidêra”. Puta coxa.

Sobre Mídia Ninja e PSOL, galera pede autocrítica mas odeia ser criticada. Minha impressão é que a esquerda das redes prefere um conteúdo mais didático. Quando você apresenta algo satírico, controverso, você cria um ruído. Pessoal gosta mesmo é de cartilha. Se você “errar”, capaz de tomar uma lacrada.

Porém.net:  Produzir informação no Brasil não é fácil. Como sobreviver sendo um ilustrador? Há muitos pedidos para uso gratuito de materiais? Como você percebe essa falta de compromisso de setores da esquerda com a profissionalização da comunicação?

VT: Trabalho como designer gráfico e ilustrador para empresas. Mesmo depois de alguns anos atuando na internet ainda não tenho um retorno financeiro pelos desenhos. Adoraria.

Sobre a esquerda, o pessoal se vira como pode, não são tempos fáceis. Imagino que haja perseguição por parte do judiciário, o golpe dificultou mais ainda a situação de quem tenta fazer comunicação contra hegemônica. Sim, há muitos pedidos de uso gratuito, às vezes fico puto, às vezes finjo que não vejo.

Ilustrador retrata a passividade com que a população aceita a intervenção militar no Rio de Janeiro. Ilustração: Vitor Teixeira

Porém.net:  Muito se fala sobre o limite de humor. Há quem diga que a arte e o humor não devem ter limites, outros artistas estabelecem os seus pessoais. Como você avalia essa questão?

VT: Demorei a chegar nessa conclusão, mas hoje penso que liberdade de expressão só é real quando é irrestrita e ilimitada. Uma “proibição ideológica”, uma limitação a determinados pensamentos, é um caminho muito mais sinistro do que o direito de poder falar a merda que você quiser, por mais absurda que essa merda possa ser. Afinal, se a liberdade de expressão tiver limites previstos pela lei, essa lei será aplicada pelo maravilhoso magistrado brasileiro, a galera dos auxílio-moradia lá.

Porém.net:  Você se utiliza muito das redes sociais, da internet, para exposição dos seus trabalho. Como avalia a força das redes nas questões políticas?

VT: Uso muito a internet, mas meu trabalho também está em jornais populares, jornais sindicais, em cartilhas escolares etc. Também faço oficinas, já dei algumas palestras. O pessoal às vezes acha que você só está no Facebook por não ter seu desenho publicado na Folha. Se dependesse de “jornalão” meu trabalho não seria minimamente reconhecido. A internet dá essa possibilidade.

Crítica à ministra do STF, Carmen Lúcia, que participou de confraternização com representantes da Shell. Ilustração: Vitor Teixeira

Porém.net:  Você já teve problemas com alguma charge retirada do ar pelo Facebook ou até mesmo sua página recebeu alguma notificação da rede em virtude de denúncias em massa? Em caso positivo, em que situações?

VT: Frequentemente tenho desenhos retirados pelo Facebook. Pelo pouco que entendo, basta que meia dúzia de usuários denuncie algo que remeta à nudez ou a símbolos tipo a suástica que o conteúdo é retirado.

O Facebook é uma rede bem escrota, pouco democrática, mas é onde tenho o maior número de interações. Com Twitter e Instagram nunca tive problemas desse tipo, imagino que pelo alcance, que é menor.

Porém.net:  Quais as tuas ilustrações preferidas e qual é a mais marcante? Por quê?

VT: Eu gostava do Dorinha, um personagem baseado no prefeito de São Paulo com as características do Riquinho Rico, aquele cartoon antigão. Mas o prefeito está se enterrando politicamente, daí fica difícil satirizar algo já auto-esculhambado.

Charge do Prefeito João Dória alcançou o recorde de visualizações a partir do perfil de Vitor: 6 milhões de views. Ilustração: Vitor Teixeira.

Gosto dos desenhos que geram polêmicas. Polêmica é bom, gera embate e esclarece muita gente. Sei lá quem falou mas “a política sem polêmica é a arma das elites”. Centrismo e moderação são uma bosta, especialmente para um artista gráfico.

Porém.net:  Caso fosse encomendada uma charge mostrando o Brasil daqui cinco anos, qual seria a visão traçada nesta ilustração?

VT: A conjuntura política brasileira parece uma montanha-russa nos dias de hoje, não me arriscaria a fazer futurologia aqui. Mas com esses militares se infiltrando no governo do vampirão e patrulhando as ruas do Rio de Janeiro, coisa boa não seria.