No dia 5 de novembro acontecerá a 18ª Parada da Diversidade LGBTI de Curitiba. Promovida pela Associação Paranaense da Parada da Diversidade (APPAD), o evento objetiva contribuir para o enfrentamento da discriminação e violações de direitos contra lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexo. É esperada expressiva participação da população de Curitiba, Região Metropolitana e dezenas de caravanas oriundas do litoral, interior do Paraná e dos estados de Santa Catarina e São Paulo.

Márcio Marins, coordenador da APPAD, lembra que a Parada tira da invisibilidade um segmento da sociedade que sofre opressão durante todos os dias do ano. Ele aponta os números da escalada de violência contra a população LGBT no Brasil. “Estamos no país que mais viola os direitos da população LGBTI. São mais de 400 assassinatos por ano de gays, lésbicas, bissexuais, trans e intersexo por razão de sua orientação sexual”. Com o lema “O que eu tenho a ver com isso?”, a parada pretende ser um grito dos curitibanos por uma cidade sem LGBTfobia, sem machismo, sem racismo.

Em entrevista ao Porém.net, Marins falou da expectativa para a realização da parada em meio ao crescente patrulhamento ideológico e moral de setores conservadores e organizações como o Movimento Brasil Livre (MBL).

Marcio Marins. Foto: Manoel Ramires

Porém.net: A 18ª Parada acontece em meio a uma ofensiva conservadora e uma espécie de retorno do “obscurantismo”, como por exemplo o cancelamento de exposições artísticas. Isso preocupa?

Marcio Marins: Vivemos um momento de recrudescimento do fundamentalismo e de movimentos reacionários, nós estamos na 18ª edição da parada, já vivenciamos situações críticas para realizar o evento, desde boicotes até ameaças de grupos neonazistas. Mas este ano a situação está agravada e foi por isso que em setembro divulgamos uma nota do Coletivo LGBTI, que é composto pela APPAD LGBTI e pelo Dom da Terra AfroLGBTI. No documento alertamos sobre o aumento dos ataques contra os movimentos e sujeitos de direitos, especialmente do campo popular. As religiões de tradições afrobrasileiras (principalmente o candomblé e a umbanda), os povos indígenas, defensores de diretos humanos e a comunidade de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexuais, são as maiores vítimas destes ataques que se agravaram após o golpe de 2016.

Você citou a questão das religiões de matrizes africanas. Como avaliam a recente decisão do STF sobre as escolas poderem promover uma crença específica no ensino religioso?

São frequentes as denúncias que recebemos de intolerância religiosa no ambiente escolar, por isso essa é uma discussão extremamente importante e um dos principais entraves à laicidade e ao pleno exercício das liberdades nas escolas públicas brasileiras. Nosso país possui normativas de educação em direitos humanos que prevê a formação na perspectiva cidadã e laica, como é o caso das Diretrizes Nacionais de Educação em Direitos Humanos de 2012. O que não podemos permitir é que determinados grupos religiosos que possuem projetos políticos neoliberais, aumentem ainda mais a intolerância, os preconceitos e as discriminações nas escolas públicas.

Recentemente foi realizado um ato em Curitiba contra a decisão da Justiça Federal que libera a chamada “cura gay”. O que representa essa decisão e quais as consequências para a comunidade LGBTI?

Os eventos realizados em Curitiba, foram organizados a partir de uma reunião ocorrida em nossa sede. Diversas lideranças de direitos humanos, representantes de organizações, conselhos de classes e coletivos estiveram no encontro realizado no dia 19 de setembro. Na reunião foi definida a criação de uma página e uma campanha denominada #TrateSeuPreconceito e do movimento Respeite LGBTI Curitiba. O objetivo do movimento é articular ações coordenadas contra a decisão da Juiz Federal, Waldemar Cláudio de Carvalho. A liminar representa um grande retrocesso e serve como combustível para mais violência e discriminação contra a população LGBTI, não tem nenhum embasamento científico e dá margem para o uso de terapias de “reversão sexual”, não permitidas pela Resolução 01/1999 do Conselho Federal de Psicologia. A decisão judicial retrógrada não só contraria normas do direito internacional, mas sobretudo atenta contra a Constituição Federal e dignidade da pessoa humana ao possibilitar que gays, lésbicas e bissexuais sejam submetidas ao tratamento psicológico por uma condição subjetiva como a sexualidade.

Ainda no campo da judicialização, recentemente a parada LGBT da Ilha do Mel foi cancelada por ordem judicial. A alegação foi falta de alvará do local. Vocês acreditam que houve um algo a mais que influenciou nessa decisão?

O argumento usado para justificar a proibição é que o evento causaria “tumulto”. Segundo o MP, a organizadora da Parada havia realizado um evento, na semana anterior, sem qualquer autorização. Compreendemos que por se tratar de uma área de proteção ambiental é necessária fiscalização para a preservação da Ilha do Mel, no entanto, a interdição as vésperas do evento geraram preocupação em razão da hostilidade que a organizadora vinha sofrendo na localidade, alguns comerciantes haviam manifestado repúdio a presença de LGBTI na Ilha. A situação se agravou no sábado com denúncias de que a PM tentava impedir o embarque de pessoas LGBTI para a Ilha do Mel.

Sobre a APPAD

Criada em 2004, a APPAD é hoje uma das associações de referência no atendimento e defesa dos direitos da população de lésbicas, bissexuais, gays, travestis, transexuais e intersexuais no Paraná. Organizadora da Parada da Diversidade, que neste ano terá sua 18ª edição, a associação sem fins lucrativos é mantida por voluntários e doadores e hoje realiza ações de promoção e defesa dos direitos humanos em diversas áreas: psicossocial, cultural, comunicação e segurança pública para o enfretamento à LGBTIfobia, racismo e o machismo.

Em 2016 a Parada da Diversidade de Curitiba teve como tema “E por falar em juventude…” e contou com mais de 80 mil participantes, que caminharam no Centro Cívico tendo à frente uma ala somente de pais e mães que estiveram presentes pelos direitos dos filhos LGBTI. Neste ano, o evento terá com saída da Praça 19 de dezembro, a Praça da Mulher Nua.