Dienifer Amanda, a Aura. Foto: Leandro Taques

Por Julio Carignano com fotos de Leandro Taques

As mulheres estão mudando a cena do rap nacional nos últimos anos. Quando o gênero explodiu no Brasil nos anos 1990 a cena era composta quase na totalidade por homens. Hoje as mulheres não só estão na linha de frente de grupos, como também estão na produção e empresariando artistas. Várias revelações têm surgido no cenário nos últimos anos e levantando a bandeira que “o lugar da mulher é onde ela quiser”.

Uma garota de 24 anos radicada desde 2015 em Curitiba, que passou a infância em um acampamento sem terra do interior do Paraná, é uma das promessas da nova geração paranaense no gênero. Aura, nome artístico de Dienifer Amanda Souza Mesquita, lançou seu primeiro EP (Eu Sou a Babilônia) em 2019 pelo selo Faveme, produtora curitibana especializada em hip hop. Em entrevista ao Porém.net, ela falou sobre sua trajetória até aqui e sobre suas aspirações.

Foto: Leandro Taques

Nascida em Santa Fé, pequeno município da região metropolitana de Maringá, Aura cresceu no acampamento Zilda Arns, em Florestópolis, região de Londrina. Por lá começou a se interessar pela música aos 14 anos. “Comecei a cantar em casa mesmo, aprendi a tocar violão, às vezes cantava na igreja”. Em 2015 ela mudou-se para Curitiba com o objetivo de estudar e, como ela diz, “virar o jogo”.

“Vim de um lugar onde não tinha perspectiva. Vim para Curitiba tentar virar esse jogo”, conta a rapper.

Seu primeiro contato com o rap aconteceu por meio de um amigo de Colombo, região metropolitana de Curitiba. “No interior ou era música de igreja ou sertaneja. Quem me apresentou o rap foi esse amigo de Colombo que tinha um grupo lá. Ele me mostrou o som dele e isso me incentivou a compor. Descobri que era por meio do rap que eu poderia realmente falar o que eu sinto. O rap é o lugar onde fui aceita, acolhida”, diz Aura.

Em 2017 ela gravou sua primeira música e no fim de 2018 subiu pela primeira vez no palco para uma apresentação. Aura recorda o nervosismo. Logo na estreia, um público de 1,5 mil pessoas em um show do rapper Djonga, um dos grandes nomes desta nova geração do rap nacional. “Fui convidada para cantar com o Bangstars [grupo de Curitiba do selo Faveme]. A perna tremeu, mas deu tudo certo”, lembra. Ela cantou a música “O poeta morrerá”, composição que também fez parte do projeto “One Time”. Depois disso, Aura também participou de outros shows com nomes como Emicida, Rael e 509-E.

No ano passado Aura lançou o EP “Eu Sou a Babilônia”, com sete faixas, e o single que se transformou em seu primeiro videoclipe. “A Babilônia está fora da curva, ela é diferente de tudo que está ali, é aquela que seguiu o caminho diferente do que as pessoas diziam que era o ‘certo’ para ela”, explica a rapper. Sobre suas letras, Aura conta que se inspira sempre no momento que está vivendo. “Minhas primeiras músicas foram músicas mais românticas, mas no ano passado comecei a fazer mais esse trabalho de imersão, discutir mais com as pessoas. Hoje não tem como não falar de política. No atual momento do país é inevitável, não tem como não se envolver”, afirma.

Foto: Leandro Taques

A temática de gênero também faz parte de suas composições. “O machismo está em tudo, na sociedade, no trabalho, na vida social e no rap não poderia ser diferente. As coisas estão mudando pois estamos conseguindo discutir isso abertamente. Ainda temos que evoluir, está longe de ser o ideal não somente no rap, mas na sociedade como um todo”. Para a artista, o hip hop oportuniza e dá voz as minorias.

“O rap é um espaço para fazermos essa discussão. Tanto do machismo, quanto do racismo, do preconceito com os LGBT”, afirma.

Outro assunto no repertório é a religião. Criada em uma família de evangélicos, Aura teve uma relação conturbada com a doutrina na infância e diz ter conhecido gente “tóxica” e “suja” dentro da igreja. “Hoje tenho uma relação madura com a espiritualidade, mas a religião em si as vezes é muito tóxica, ela machuca. Ela tenta abafar quem você é, forçar você a ser quem não é. Tive o desprazer de conhecer pessoas extremamente sujas na religião. Por um tempo cheguei a generalizar, mas hoje estou mais madura e tenho uma relação saudável com Deus”, comenta.

Sobre os planos para 2020, Aura adianta que têm novas composições e que lançará alguns singles de forma independente. “A Faveme me abriu portas, me possibilitou conhecer pessoas e me proporcionou a experiência de subir no palco. Neste ano seguirei independente, mas devo muito a galera da produtora, que sempre foram muito parceiros”.

Foto: Leandro Taques

Consciente da dificuldade de ser artista independente e viver de música, a jovem alia a rotina de rapper com o trabalho em uma panificadora e com os estudos. Está cursando Letras/Inglês na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). “Com muita luta e perseverança podemos chegar onde a gente quiser. A primeira coisa é ter fé e acreditar no seu trabalho, pois vai ter um monte de gente para desacreditar. E assim vamos matando três leões por dia”, conclui a rapper.

Mais sobre o trabalho de Aura pela sua página no Facebook no ou pelo Youtube.

Confira abaixo Eu Sou a Babilônia, primeiro videoclipe da artista.