Sempre tive em conta o imenso respeito pela Geração de 1968. Neste ano muito louco da era moderna, que registra as mortes de Martin Luther King e Robert Kennedy. Ano da Guerra do Vietnã. Ano em que a chapa esquentou nas ruas de Paris, com levantamento de barricadas, fechamento da Universidade Sourbonne, e estudantes e trabalhadores se unindo contra o autoritarismo do governo de Charles de Gaulle. No Brasil, o pau também comeu. Era corridos quatro anos desde o golpe de 1964 – a famosa revolução – que terminou na instalação da Ditadura Militar. Em 1968, no seu fim, após ano tenso de muitos protestos e rebeliões contra o regime, o general Costa e Silva baixou o Ato Institucional 5, resultando na perda de mandatos de parlamentares contrários aos militares. Um pouco antes disso, no mês de junho, era realizada no Rio de Janeiro a passeata dos Cem mil. Uma grande manifestação organizada pelos estudantes contra o regime e que terminou com a morte de um estudante.

Pois bem, noves fora, é justamente essa geração que ocupa o poder no Brasil neste momento. Quer dizer, não exatamente aqueles que lutaram por direitos, pela democracia, pela redução da desigualdade, entre outros. Mas dominam o país políticos e empresários que eram jovens neste período. É o caso do atual presidente Michel Temer que em 1968 tinha 28 anos. Ele representa uma classe de homens brancos, de cabelos grisalhos – ou acaju -, conservadores e com ideias liberais que eram combatidas há quase 50 anos. De lá pra cá, Temer e seus asseclas formaram um governo autoritário, na medida em que tomam medidas no Congresso Nacional de costas para a população ou ao que foi aprovado nas urnas em 2014. Um governo aristocrático que aperta o cinto apenas do povo enquanto mantém as regalias da classe política, jurídica e financeira. Um governo corrupto, que se mantém no poder na base de compra de aliados.

Campanela/CPDoc JB

Nada disso surpreende atualmente ou em 1968. Talvez a diferença esteja na juventude da geração de 2018. É certo que no país tem ocorrido greves gerais e manifestações contra os “anti68” que ocupam os desmandos do país. Porém, é muito pouco diante da ebulição nas ruas que deveriam estar acontecendo. Em 22 de julho de 2017, quando essa crônica está sendo rabiscada, se registra que coquetéis molotov não estão sendo lançados na janela de bancos, barricadas não estão instaladas na frente da Bovespa, tampouco as castas financeiras estão se sentindo ameaçadas pelo bafo inebriado de cachaça e raiva dos jovens.

Sim, como registro histórico – novamente – tem ocorrido escrachos contra políticos, ovadas na realeza e toda grita nas redes sociais. Coro que encontra adversários justamente em boa parte da juventude que prefere preservar vidraças do que combater o vandalismo político que tira dinheiro de escolas, hospitais, segurança, enquanto se ri de todos dizendo que a economia estagnada está entrando nos trilhos.

A juventude de 2017/18 foi cooptada e treinada em 2015 por movimentos que defendem o atual governo. Ela esteve nas ruas tirando selfies com as forças armadas que matam preto na periferia, educadamente xingou a presidente eleita de vaca e persegue, como orientou a emissora que em 1968 era aliada do regime militar, o maior líder popular que tirou da fome mais de 40 milhões de brasileiros. Essa juventude – ou parcela dela – prefere ter como ídolo um indivíduo que durante o regime militar foi acusado de tentar explodir quartéis no Rio de Janeiro para fomentar a rebeldia. Um senhor que votou pelo fim da leis trabalhistas e que representa o machismo em uma sociedade predominantemente formada por mulheres que buscam igualdade de direitos.

Pois bem, a semana terminou com os representantes da geração “anti1968” aumentando os impostos da gasolina para conter o rombo das contas públicas que eles produziram ao manter as benesses do mercado, das classes políticas e judiciárias. Ou seja, colocaram gasolina no palheiro seco. Porém, parece que o pavio da geração 2017/18 resiste a explodir.