“Nosso sindicato não é nenhum demônio”

Presidente de entidade que representa trabalhadores da BRF, em Ponta Grossa, está impedido de protestar contra a empresa





Manifestação do sindicato em frente à fábrica da BRF. Foto: Divulgação

Conhecido por ser um setor que traz inúmeros problemas de saúde para seus trabalhadores, o setor da alimentação, especificamente do processamento de carnes, está trazendo dificuldades extras em Ponta Grossa, no interior do Paraná.

Uma liminar expedida pelo juiz Fábio Marcodes Leites, da 4ª Vara Cívil da cidade, impede o sindicato da categoria de realizar qualquer tipo de manifestação contra a empresa. “Uma espécie de medida protetiva”, ironiza o presidente o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Massas, Laticínios, Carnes, Derivados e Alimentação de Ponta Grossa e Região, Luís Pereira dos Santos.

De acordo com o dirigente, ele está proibido de promover atos de mobilização da categoria em frente à fábrica da BRF. Além disso, não pode sequer expressar-se sobre eventuais irregularidades cometidas pela empresa em suas mídias sociais. “A argumentação que está na liminar tenta transformar o nosso sindicato em um demônio, mas não é bem assim. É demônio para quem não respeita trabalhador”, comenta Santos.

De acordo com ele, o papel do sindicato no caso específico da fábrica, tornou-se de despachante. “Recebemos as denúncias e encaminhamos ao Ministério Público do Trabalho. É o que podemos fazer enquanto não conseguimos derrubar essa liminar”, explica o dirigente. Segundo ele, nos últimos anos, foram mais de 100 denúncias encaminhadas ao órgão.

A entidade representa, ao todo, 600 trabalhadores na cidade. Metade deles são empregados da BRF. “Mas a empresa, também no intuito de nos prejudicar, chamou os trabalhadores no seu setor de RH e orientou que todos eles passassem a contribuir com um outro sindicato, não tão combativo”, explica.

Segundo ele, todo esse processo teve início em 2012, quando uma greve paralisou a fábrica da empresa por 10 dias. “Tem reflexos até hoje. Um dia para eles com todos parados é muito prejuízo. Imagine então 10 dias. A empresa não aceita isso até hoje”, completa.

Denúncias – Enquanto isso, segundo Santos, uma série de denúncias vão se acumulando no Ministério Público do Trabalho de Ponta Grossa. Boa parte das que chamam mais a atenção envolvem as mulheres, inclusive grávidas.

Uma delas, segundo Santos, estava com o filho recém-nascido na UTI e precisava de ao menos um mês de afastamento para cuidar do bebê. “Tentamos negociar, para que ela pagasse esse período. Não apenas não ajudaram como passaram a assediar essa trabalhadora para que ela pedisse demissão. O resultado foi que o filho morreu e ela foi demitida em novembro do ano passado”, recordou.

Outra mulher, grávida de oito meses, foi demitida por justa causa da empresa. “Simplesmente pegaram os atestados e declarações dos médicos para fazer a demissão, que claro, foi revertida na Justiça do trabalho. Mas no momento em que ela mais precisava, durante sua gravidez, não só não teve o apoio da empresa como foi demitida”, reclama.

Há ainda o caso de uma trabalhadora, gestante de seis meses, que foi proibida pela gerência de pegar um segundo pedaço de melancia, a sobremesa ofertada naquele dia. “Fizemos um protesto. Compramos 11 frutas grandes e levamos na frente da fábrica e distribuímos. Os trabalhadores vieram nos contar que esse tipo de ação era reincidente”, recorda o dirigente sindical.

O tratamento, segundo ele, é oposto para trabalhadores de áreas administrativas da empresa . “Quando vamos na sede da BRF em Curitiba, no administrativo, é um negócio de luxo. Têm umas 10 ou 15 máquinas com café, chocolate e tudo mais. Basta apertar um botão e sai o que você quiser. Em todas as rodadas de negociação a empresa faz mesa farta com tudo pra você pegar à vontade”, compara.

CAT e Multa – Santos também reclama da falta de compreensão de parte dos médicos sobre a saúde dos trabalhadores. Ele recorda que em um determinado momento um trabalhador sofreu um acidente de trabalho e precisou de “cinco pontos” no dedo. Contudo, sem atestado, voltou a trabalhar logo após receber o atendimento médico.

Em determinado momento um trabalhador teve o rosto queimado com vapor. A empresa não emitiu CAT o que levou o sindicato a realizar uma denúncia no MPT. O fato, de omissão do comunicado de acidente de trabalho, resultou em uma multa de R$ 40 mil. “Desta vez conseguimos nosso objetivo, mas esperamos mais celeridade também do Ministério Público do Trabalho”, pondera o dirigente.