Um dia antes de completar dois anos de prisão, a deputada do Parlasul e fundadora da organização “Tupac Amaru”, Milagro Sala, publicou uma carta aberta em que denuncia que após sua detenção arbitrária “iniciou-se uma perseguição feroz a quem pensa de forma diferente na Argentina”. Na carta, a presa política de 53 anos disse que é vítima de “operações do judiciário e da imprensa” e enfatizou que, apesar da “impotência” dos 729 dias encarcerada e do “assédio constante”, ela e seus companheiros estão “mais de pé do que nunca.”
“Eles acreditavam que, com essa prisão arbitrária, iriam nos destruir. Saibam que estamos fortalecidos”, escreveu a representante do Parlasul, pedindo que seus “camaradas continuem lutando para que necessidades se tornem direitos”. Milagro está presa desde 16 de janeiro de 2016, acusada de incitação à violência e tumulto por encabeçar um protesto na província de San Salvador de Jujuy, contra as mudanças impostas pelo governador Gerardo Morales no sistema e programa de cooperativas.
“À medida que os dias passam, estamos perdendo a conta do número de presos políticos, que agora são mais de vinte. Presos por querer um mundo melhor, por defender os direitos daqueles que têm menos, por enfrentar as políticas de fome e exclusão impulsionados pelos dirigentes do Cambiemos”, disse Milagro, referindo-se a líderes políticos do partido do presidente Mauricio Macri.
“Meus companheiros e eu, apesar do constante assédio e das prisões, estamos mais do que nunca firmes em nossos ideais. Acreditavam que iriam nos destruir, tirar nossa alegria e dignidade. Pois saibam que nos fortaleceram”, diz a carta.
Em outro trecho, Milagro enfatiza sua situação pessoal e diz que os últimos dois anos foram “muito difíceis” e “muito impotentes”. “Aqueles que me conheciam em liberdade sabem que não fiz nada além de resolver situações de companheiros e às vezes de pessoas que nem conhecia. Nunca foi para favorecer Milagro Sala”, acrescentou.
Quem é Milagro
Nascida em San Salvador de Jujuy, na fronteira com a Bolívia, a indígena Milagro Sala quando recém-nascida foi abandonada na porta de uma igreja dentro de uma caixa de papelão. Foi adotada por uma família de classe média e, somente aos 14 anos, descobriu sua verdadeira história. Saiu de casa e foi morar na rua. Aos 18 anos foi presa, ficou sete meses na prisão. Fez greve de fome e se tornou responsável pela cozinha e alimentação de outras prisioneiras. Aos 25 anos, adotou legalmente doze meninos de rua.
Além de deputada do Parlasul, ela é fundadora do movimento “Tupac Amaru”, espécie de cooperativa que conta com cerca de 66 mil trabalhadores filiados, que começou construindo moradias populares em regime de mutirão. O grupo construiu nos últimos 14 anos quatro mil casas, além de um bairro de mais 1.800 casas no subúrbio de Jujuy, a 10 quilômetros do centro da cidade. A organização também foi responsável pela construção de três escolas e dois centros de saúde na região. Os pequenos condomínios possuem biblioteca, auditórios, quadra de esportes e piscina.
Milagro foi presa em 16 de fevereiro de 2016 em sua casa, depois de uma operação policial que contou com mais de 40 oficiais. Ela é acusada de bloqueio de vias, impedir a livre circulação de pessoas e veículos e suposta recusa de cumprir a decisão do governo de executar um plano de regularização das cooperativas.
