Campanha de Bolsonaro pode ser cassada por Caixa 2, avalia especialista em direito eleitoral

Uso de empresas para comprar mensagens de Whatsapp configura crime eleitoral de abuso de poder econômico





Alex Ferreira / Câmara dos Deputados

A revelação de que empresas foram utilizadas para pagar o envio de mensagens favoráveis ao candidato Jair Bolsonaro (PSL) e contra seus adversários, em especial Fernando Haddad, pode levar a cassação da candidatura da chapa inteira. É o que avalia Guilherme Gonçalves, advogado graduado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestrando em Direito Constitucional pelo Centro Universitário Autônomo do Brasil – UniBrasil. Especialista em Direito Público e Direito Eleitoral. Nessa entrevista ao Porém.net, ele explica quais são os crimes eleitorais cometidos por Bolsonaro. Para o especialista, “no caso, há uma dupla gravidade, no sentido de Caixa 2. Porque é dinheiro não contabilizado e fornecido por pessoa jurídica, que a legislação eleitoral considera fonte vedada”. Esse é um dos argumentos que serão utilizados pelo PT, PSOL, e PCB, que já fizeram pedido de audiência à presidenta do TSE, ministra Rosa Weber.

Porém: A compra de mensagens favoráveis a Bolsonaro não pode ser considerada simplesmente apoio de campanha?
Guilherme Gonçalves: A compra de mensagens de Whatsapp por empresas que apoiam Bolsonaro não é considerada manifestação individual do eleitor, pois ela só pode e deve ser gratuita. Nunca se pode utilizar nenhum instrumento de impulsionamento, fora daqueles que o cidadão comum tem acesso.

Porém.net: Então, o impulsionamento por empresas é grave?
Guilherme Gonçalves: “No caso denunciado pela Folha de São Paulo é ainda mais grave porque se tratam de empresas. Desde o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4650, as empresas e as pessoas jurídicas estão absolutamente proibidas de participar de qualquer ato da vida política da democracia representativa brasileira. Seja antes ou durante as eleições. Sobretudo, doar, direta ou indiretamente na campanha a favor de candidato, partido ou coligação”.

No caso, há uma dupla gravidade, no sentido de Caixa 2. Porque é dinheiro não contabilizado e fornecido por pessoa jurídica, que a legislação eleitoral considera fonte vedada. Essa situação é ainda mais agravada pela violação ao artigo 57C, da legislação eleitoral, da lei 9504, que explicitamente determina que só candidato, partido e coligação, podem impulsionar, usando internet, redes sociais, e a propaganda tem que ser absolutamente identificada.

Ainda mais: o TSE, em reiteradas decisões, tem entendido que impulsionamento em redes sociais só é permitido para propaganda positiva e não para propaganda negativa.

Guilherme Gonçalves. Foto: divulgação

Porém.net: O uso dessas empresas pode ser considerado Caixa 2 e levar a impugnação?
Guilherme Gonçalves: A circunstância dessa denúncia materializa uma gravidade muita séria em relação a campanha. Isso é mais agravado pelo valor que, segundo a reportagem da Folha de São Paulo, está sendo utilizado. Se imaginarmos que a campanha pode gastar no máximo R$ 70 milhões, e mais 40% no segundo turno, o valor de R$ 12 milhões é substancial e tem a gravidade necessária e exigida pela legislação eleitoral para se aplicar uma pena de cassação. O artigo 30A, que torna ilegal o Caixa 2 eleitoral, ele não prevê gradação de suas sanções. Ou é cassação ou não tem outra sanção.

Porém.net: Bolsonaro pode ser cassado agora, como querem os partidos?
Guilherme Gonçalves: A legislação eleitoral permite que uma eventual cassação de mandato por esses fatores seja procedida de três maneiras. Durante a campanha eleitoral, é possível ajuizar uma ação de investigação judicial eleitoral e pode ser ajuizada a  qualquer momento até a diplomação dos candidatos. Depois da diplomação, as ações de investigação judicial eleitoral persistem, se não forem julgadas até lá. Depois da diplomação, há duas espécies de impugnação ao diploma e ao mandato. São elas recurso contra a expedição do diploma, que me parece não ser possível de utilizar nesse caso, porque ele se destina a apurar casos de ilegibilidade superveniente e há uma ação constitucional que está prevista no parágrafo décimo primeiro do artigo 14 da Constituição Federal que é a ação de impugnação de mandato eletivo.

Porém.net: Além dos partidos, cidadãos comuns podem pedir a anulação da candidatura?
Guilherme Gonçalves: Se houverem várias ações postas com o mesmo conteúdo de fato, no caso, por suposto apuração do uso de financiamento de rede social e Whatsapp para impulsionamento de propaganda negativa feito por empresa, atualmente há uma disposição na lei eleitoral, o artigo 96B, determinando que essas ações sejam todas reunidas para julgamento conjunto.

O que se busca apurar é se a eleição desse candidato, se a sua campanha foi ou não contaminada pelas várias formas de abuso de poder. Mesmo que o candidato não tenha participado diretamente ou explicitamente das irregularidades, que geraram abuso, ele ainda assim pode sofrer a cassação, porque o que se avalia é a legitimidade do pleito do que a culpa ou dolo do candidato de provocar algum tipo de conturbação da sua eleição.