O PSL pode ter inovado e criado o CAIXA 3 eleitoral. A tática consistiria em desviar recursos do fundo partidário destinado a mulheres para irrigar candidaturas de homens ou supostamente simular gastos de campanha em gráficas. No ano passado, o TSE decidiu que pelo menos 30% do fundo teriam que ficar obrigatoriamente com as candidatas que compunham também os 30% das candidaturas.
O partido é suspeito em pelo menos três casos. No principal deles, o ex-presidente do partido, Gustavo Bebianno, foi exonerado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL). No entanto, a execução do aliado do governo não parece ter sido por causa do desvio de verbas de campanha e sim por conta de uma discussão pública entre Bebianno e o filho do presidente, Carlos Bolsonaro, pelo Twitter.
Porém, Bebianno entrou de laranja nessa história. O alvo principal é o presidente do PSL de Pernanbuco, Luciano Bivar, que destinou R$ 400 mil para uma candidata laranja no estado. O dinheiro teria sido utilizado com santinhos eleitorais há 48 horas da disputa. Para Bebianno, “se Bivar escolheu candidata laranja, problema dele”.
Uma das perguntas nessa história seria, de onde saíram esses R$ 400 mil? Provavelmente do fundo partidário destinado às mulheres. Nessa última eleição, o STF decidiu que “verbas acumuladas por partidos políticos e reservadas para candidaturas de mulheres podem ser transferidos para as contas individuais das candidatas ainda nestas eleições”, como registra o site ConJur. E não era pouco dinheiro. R$ 17 milhões. Só o PSL teria engordado o caixa com R$ 1 milhão.
Outra regra alterada impôs que os partidos destinem cerca de 30% dos recursos do Fundo Partidário para as mulheres, como explica a bancária Marisa Stedile, diretora de Políticas Sociais da Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Paraná (FETEC-CUT-PR). “Sei das dificuldades de competir com candidaturas recheadas de recursos. A lei que prevê o repasse de 30% dos recursos do Fundo Partidário para candidaturas de mulheres prevê também que as mulheres tenham 30% do tempo de exposição nos programas eleitorais de rádio e TV, coisa que dez anos atrás não havia e deixava de fora muitas candidaturas”, explica. Marisa lembra que as mulheres representam 44% das filiações partidárias, mas que isso não se reflete nas chapas de candidaturas, nem nas representações do Congresso.
O PSL ficou com R$ 9.203.060,51 do fundo partidário, que na última eleição chegou a R$ 1,7 bilhão. Desse montante, Bivar ficou com R$ 1,8 milhões do fundo eleitoral. Isso representou 19,5% do total de recursos do partido. À época, Bivar disse que o recurso seria dividido entre os candidatos e candidatas de Pernambuco.
Mulheres laranjas
O caso de Bivar poderia ser considerado isolado se outras duas suspeitas não fossem descobertas em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. Em ambos casos mulheres ou recursos destinados à elas foram utilizados como laranjal. Em Minas, o ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio se beneficiou de recursos destinados às mulheres para fazer sua campanha. Quase R$ 280 mil teriam sido desviados.
Já a última denúncia, no RS, revela que a empresária Carmen Flores repassou dinheiro do fundo partidário para sua filha e neta. Ela também de comprar móveis para sua loja. De acordo com a Folha de São Paulo, o desvio chega a R$ 200 mil.
A deputada federal gaúcha Maria do Rosário (PT) acredita que não são casos isolados, mas que envolvem uma coordenação do partido e sistêmica.
“No partido do presidente da República há claras denúncias que já indicam comprovações sobre o uso indevido do dinheiro das mulheres para eleger homens que estão defendendo aquele que já foi condenado por danos morais”. destacou.
Partidos usam mulheres como laranjas
O Porém.net conversou com Guilherme Gonçalves, advogado graduado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). O especialista em Direito Público e Direito Eleitoral fala sobre a utilização de mulheres como laranjas e possíveis punições ao partido do presidente Jair Bolsonaro. Para ele, as mulheres são utilizadas para se ter acesso a recursos públicos e destiná-los a homens.
Porém.net: A legislação eleitoral define percentual mínimo de mulheres por partido para disputar cargos. De quanto é esse percentual e a legislação eleitoral atrela recursos do fundo para essas campanhas? Ou seja, o dinheiro não é do partido, mas para ser utilizado na campanha delas?
Guilherme Gonçalves: A legislação eleitoral define, com clareza, dentro da política de incentivo à participação feminina, que no mínimo 30% das vagas das candidaturas proporcionais devem ser obrigatoriamente preenchidas por mulheres como condição de validade da candidatura de homens. Se um partido lança 5 candidatos, pelo menos 2 têm que ser mulheres. É sempre 30% ou mais. O STF definiu por interpretação que a mesma composição deve ser assegurada para o financiamento de candidaturas femininas com os recursos vindo do fundo partidário e do fundo especial de campanha.
Porém.net: Os diversos casos do laranjal do PSL apontam sempre transferência de recursos delas para eles. Isso não poder ser um indício que o PSL manipulou o sistema para beneficiar seus candidatos?
Guilherme Gonçalves: Os indícios apontam que na verdade, desde que a cota de candidatas femininas se tornou critério eleitoral, tem sido adotado a criação de candidaturas de fachada. E isso não é um privilégio do PSL a candidatura de mulheres laranjas. Elas são lançadas sem formação política ou desejo de concorrer. É apenas para preencher a cota. No caso da denúncia da divisão de recursos, o que acontece é que se utilizam dessas candidaturas de fachada para através delas canalizar recursos público de campanha que efetivamente acabam sendo utilizado para outras candidaturas e outros candidatos, normalmente, homens.
Porém.net: É papel de quem investigar se houve manipulação desses recursos e as punições são isoladas ou aplicadas a sigla?
Guilherme Gonçalves: A competência para investigar é da justiça eleitoral para que possa verificar tanto os problemas dentro do âmbito eleitoral quanto apurar os desvios de finalidade de recursos. O uso desviado pode dar uma margem de sanções, inclusive impedir o partido de receber recursos do fundo partidário. Inclusive, se ficar comprovado que houve desvio de uma candidata que recebeu recurso do fundo especial de financiamento para a candidatura de um homem, isso poderia ser punido dentro da lei de improbidade administrativa. Aí cabe ao Ministério Público Federal a investigar.
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