“Política faz o meu gênero”

Cotas, feminicídio político e descarte de minorias é discutido em lançamento de livro do Instituto Por.De.Para Mulheres





Por Silvia Valim

Mais de oitocentas pessoas estiveram nesta segunda-feira (11) no lançamento da segunda edição do livro Gênero e Resistência no Teatro da Reitoria da UFPR, em Curitiba. A obra surge do Encontro de Pesquisa Por.De.Para Mulheres de 2018 e é organizado pelas próprias participantes do grupo autointitulado como mulheres que buscam valorizar o protagonismo feminino tanto na política quanto na pesquisa.

Responsável pelo prefácio do livro, Luciana Panke esteve no lançamento e citou sua recente experiência na Bolívia, onde as mulheres são maioria no poder legislativo com mais de 50% de representantes femininas na câmara dos deputados. O relato veio como forma de mostrar o quanto o Brasil ainda precisa evoluir nesta área, visto que é 156º na representação feminina em parlamentos. Em La Paz, a pesquisadora foi incumbida de falar sobre feminicídio político, uma das principais preocupações das mulheres com cargos políticos naquele país. “Quando pensamos que estamos evoluindo, nos deparamos com informações como essa. Eu não sabia que esse tipo de medo permeava as bolivianas. Imaginei que estavam dominando e sendo respeitadas, e na verdade descobri que até piada sobre a forma como se vestem elas ouvem dentro do parlamento”.

Foto: Ramiro Garcia

JOVENS MULHERES

Alunas do Curso de Política Por.De.Para Mulheres e voluntários organizaram o evento que teve transmissão ao vivo pela UFPR TV, assim como pela página do Instituto no Facebook. Eneida Salgado, idealizadora do projeto que começou como grupo de pesquisa em 2017 e já está na sua terceira edição por meio da escola de verão, trouxe reflexão sobre o número de mulheres que estão ocupando as cadeiras da Universidade Federal do Paraná, que tem apoiado o curso cedendo alguns professores e também espaço físico para as aulas. “Espero que daqui a dez anos minha filha olhe e pergunte “mas por que era necessário tudo isso?”. Que ela olhe pra trás e indague porquê disso e veja que muito mudou. Porque ninguém vai abrir a porta do parlamento pra nós. Temos que ocupar, e resistir porque política faz o meu gênero”.

Diva Guimarães. Foto: Ramiro Garcia

LIÇÕES DE VIDA

Após a breve abertura preparada pelas pesquisadoras, a paranaense de 80 anos, Diva Guimarães, filha de lavadeira e neta de português com escrava e que fez sucesso na última Feira Literária de Paraty iniciou o debate sobre gênero e resistência no evento desta segunda. A professora negra contou sua história de luta por direitos que começou dentro da escola quando foi agredida por uma professora simplesmente por ser negra. Com a história ela defendeu o quanto “um professor tem poder tanto para levantar como para destruir”, refletiu.

Diva defendeu ainda as cotas raciais como forma de resistência dos negros pedindo que eles não desistam desse direito. O argumento veio seguido de fatos: Na década de 1830, por exemplo, o Brasil teve vários estados que proibiram que negros não-escravizados frequentassem a escola. A Lei de Terras, de 1950, também não permitir aos negros a posse de terra por trabalho. Foi citada por Diva também a Cota do boi, instituída em 1968 pelo então presidente, General Costa e Silva, que beneficiava apenas filhos de fazendeiros no ensino. Diva solicitou: “Cotista: Não tenha vergonha de ser cotista porque cota sempre existiu no nosso país”, finalizou.

Manuela D´Ávila. Foto: Ramiro Garcia

RESISTÊNCIA E LUTA

Manuela D’Ávila, candidata a vice-presidente da República na última eleição também aproveitou o evento para lançar o livro Revolução Laura, que fala de maternidade e resistência. No entanto, Manuela não veio para falar da obra, e sim do tema do encontro. A política comparou a busca por igualdade com a necessidade de empatia: “O outro merece o mesmo tratamento, o mesmo olhar, o mesmo direito que eu. […] Há um descarte em massa dos negros no Brasil, assim como as mulheres e os trabalhadores. Nós vivemos um tempo de crise de novas colônias e formação de descartes em massa e é a isso que precisamos resistir”.