“Não existe democracia sem uma polícia democrática”, diz coordenador dos Policiais Antifascismo PR

Policiais antifascistas querem ampliar conexão entre trabalhadores da segurança pública e a sociedade





Coordenadores do movimento e lideranças petistas durante o I Encontro dos Policiais Antifascismo PR. Foto: Júlio Carignano

Surgido há pouco mais de três anos no Brasil, o movimento “Policiais Antifascismo” começou a ganhar adeptos no Paraná depois da eleição do presidente Jair Bolsonaro. O grupo conta com policiais civis, federais e militares, bombeiros, guardas municipais e agentes penitenciários com viés progressista que dão uma dimensão cidadã à segurança pública e reivindicam questões como o direito de greve, à livre manifestação, filiação partidária e o fim de prisões administrativas.

Essas pautas compõem o Manifesto Nacional dos Policiais Antifascistas que ainda questiona o modelo estrutural das forças policiais e pauta-se em uma segurança pública democrática que garanta os direitos humanos para todos. Como movimento recente, seus coordenadores regionais estão articulando encontros abertos em vários estados com o objetivo de apresentar o movimento à sociedade, fazer parcerias com movimentos sociais e buscar novas pessoas para somar na luta. No Paraná, o I Encontro dos Policiais Antifascismo ocorreu na última sexta-feira (7) na sede do diretório estadual Partido dos Trabalhadores (PT).

Se opondo a perspectiva conservadora e autoritária que caracteriza as instituições policiais, o grupo quer estreitar relações entre o trabalhador da segurança e a população. “Neste momento histórico de crescimento do autoritarismo queremos ampliar essa conexão. Eu já estive em dois lados de uma manifestação. Do lado do policial que está ali a trabalho e também como policial coordenando um grupo em reivindicação. A polícia não pode estar afastada da população, como se o policial não fosse um cidadão. Queremos romper essa construção histórica”, diz Martel Alexandre del Colle, coordenador dos Policiais Antifascismo no Paraná.

Martel é um policial militar aposentado aos 29 anos por causa de um quadro de depressão e que responde um processo de exclusão na corporação. Sua história ficou conhecida nacionalmente após grande repercussão nas redes sociais. Autor de textos críticos à PM e aos governos Bolsonaro e Ratinho Jr., ele é acusado pelo Conselho de Disciplina da PM do Paraná de “trazer a conhecimento público imputações graves contra a instituição bem como em desfavor de autoridades”

No dia 21 de janeiro, Martel foi notificado de investigação interna que resultou na acusação. “O que querem é que não falemos ou questionemos o sistema, mas a minha resposta é que seguirei falando sobre o sistema”, diz o militar. “Queremos impedir ou desmoronar estruturas fascistas que possam existir dentro das corporações”, destaca Martel. O policial defende melhores condições de trabalho dos agentes de segurança e um modelo de polícia mais democrática.

“Não existe democracia sem uma polícia democrática. Se eu deixo a polícia se auto regular, criar seu próprio sistema sem que a população não participe das decisões da polícia corremos o risco do fascismo prosperar”, afirma Martel.

O movimento tem colocado o dedo na ferida em temas polêmicos à segurança pública, entre eles a legalização das drogas, o que provoca reações dentro e fora das corporações. “É uma luta árdua, há muita desconfiança quando você é uma policial e se apresenta como de esquerda. Mas é importante que a gente se exponha e até apanhe um pouco, pois essa nossa exposição também é uma forma de proteção. Quanto mais a sociedade souber que existe um outro viés para a segurança pública, a sociedade vai despertar mais sobre essa pauta que é urgente”, afirma a delegada Maria Nysa Moreira, que atua na Polícia Civil em Paranaguá.

Policiais pela Democracia

Foto: Julio Carignano

O I Encontro dos Policiais Antifascistas contou com a presença de representantes de um outro coletivo chamado “Policiais pela Democracia do Paraná”. Jamyle Souza, uma das fundadoras do grupo, trouxe ao debate outro agravante: o machismo dentro das instituições. “Para nós temos o agravante de sermos mulheres em espaços que são patriarcais. Presenciamos abordagens truculentas, muitas vezes não sabemos como agir”, disse a policial civil, que propôs a criação de um Fórum Popular permanente para debater o tema da segurança pública envolvendo trabalhadores da segurança, movimentos sociais, partidos políticos e a sociedade em geral.

“Precisamos discutir que polícia a gente quer. Que sistema penitenciário a gente quer”, diz Jamyle.

Eyrimar Fabiano Bortot também faz parte dos Policiais pela Democracia no Paraná. Além de policial civil, ele é professor da rede estadual de ensino e aponta o papel pedagógico do agente da segurança pública. “Ser policial é fazer pedagogia 24 horas por dia. Porque? A gente sempre está atendendo alguém, orientando alguém. Temos a possibilidade de explicar essa relação da opressão de classe, de como o estado funciona para o rico e para o pobre. Infelizmente o cidadão comum se encantou com o discurso do Bolsonaro, ‘de que bandido bom é bandido morto’, ‘que tem que matar mesmo’. Precisamos desarmar essa construção de que é a polícia tem que reprimir. Infelizmente essa construção é feita dentro das corporações e vai para o cidadão comum”, ressalta Eyrimar.