Carta de Natal ao prefeito Greca

“Não é abençoado aquele que fala em meu nome, mas faz suas oferendas aos ricos e abandona os pobres”





Foto: Pedro Ribas/PMC

Por Doutor Rosinha*

Querido Rafael Valdomiro Greca de Macedo,

Sei que na política você gosta de ser chamado de Rafael Greca, mas preciso te dizer que “aqui onde vivo”, nós tratamos as pessoas, até para não cometer erro de identificação, para que no futuro – não queria dizer – ou seja, na morte, não cometamos injustiças.

Talvez você não compreenda bem eu escrever “aqui onde vivo”, mas sim, vivo na vida eterna e junto com meu filho e o nosso Pai acompanhamos tudo que acontece no mundo. É um acompanhamento diário e registrado com o nome completo, afinal precisamos de todas as informações para saber quem entrara e quem não entrara em “Nossa Casa”.

Sei que você (desculpe a informalidade) é meu devoto e prestou-me uma homenagem – que quero te dizer que me preocupa – linda ao construir, em 1993, aquele memorial entre as ruas São Francisco e Barão de Cerro Azul.

Só um pequeno comentário: convivemos com São Francisco, é um Santo de verdade. Quanto ao Barão sei que está por aqui, mas que barbaridade o Marechal Floriano – que não sei por onde anda – mandou fazer contra ele.

Quando disse que a homenagem me preocupa, errei, não é a homenagem, mas sim a imagem. Tomei conhecimento que a imagem foi confeccionada em bronze e que mede 2,5 metros e pesa 650 quilos e está a 10m de altura.

Rafael – homem que se imagina de Deus – se esta imagem cair quando estiver passando gente! Digo que se “imagina de Deus” por que como te falei por aqui observamos tudo que passa por aí, e são muitos os que se imaginam de Deus e cometem tantos pecados e até crimes. Usam muito o nome do nosso Pai em vão. E – convenhamos – você está exagerando um pouco.

Você pode dizer ou pensar que não preciso me preocupar, que a imagem está bem fixa, que não caíra. Sei que está, mas aproveito para lembrar do apóstolo Paulo, que em uma de suas cartas dirigida aos cristãos que estavam em Roma escreve:

Porque sabemos que toda a criação, a um só tempo, geme e suporta angústias até agora. E não somente ela, mas também nós, que temos as primícias do Espírito, igualmente gememos em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos, a redenção do nosso corpo. Porque, na esperança, fomos salvos. Ora, esperança que se vê não é esperança; pois o que alguém vê, como o espera? (Carta aos Romanos 8.22-24).

Paulo, que também vive aqui conosco, refere-se à criação de Deus, a terra habitada e todo o sofrimento – pestes, pragas, terremotos, fome, pobreza, vítimas do autoritarismo e da perseguição – dos que nela vivem. Lembro também que naquele tempo os cristãos romanos viviam sobre a opressão do Império Romano.

Rafael, hoje o povo vive sob a exploração do capital, do capitalismo e da opressão dos governantes. E você é um desses governantes. E, desculpe novamente a sinceridade, “você não está governando para o povo pobre e necessitado”.

Com muita dor no coração vimos você entregar 300 milhões para os ricos donos das empresas de ônibus da cidade da qual fui designada – e me sinto honrada – padroeira.

As luzes de Natal iluminaram o Parque Tanguá. Foto: Ricardo Marajó

Acompanhei que há um pouco mais de três anos atrás você mandou me limpar, digo, mandou limpar a imagem e na ocasião você disse: “Eu e Margarita pedimos a Nossa Senhora da Luz dos Pinhais que protegesse para sempre Curitiba”. Disse também, e entendi que foi em forma de oração: “Nossa Senhora da Luz, mãe da nossa terra, pede ao teu filho poderoso que abençoe nosso povo para vencer qualquer tribulação”.

Tenho conversado com o meu filho – tão lembrado nestes tristes momentos – sobre a pandemia e o que vem ocorrendo na cidade de Curitiba, que novamente repito: “me sinto lisonjeada e feliz em ser a padroeira”. Estamos fazendo tudo para proteger o nosso povo, mas quem lidera politicamente os territórios tem que ajudar e sentimos que nem todos ajudam. Muitos ficam nas orações e nada ou pouco tem feito, quando não tem trabalhado contra as nossas proteções e, sinto dizer que você está entre um deles.

Rafael você não está usando o poder que tem para impedir o avanço desta pandemia. Com o discurso de homenagear o nascimento de meu filho Jesus você – e tantos outros governantes – está estimulando a aglomerações de uma maioria de inocentes e outros que desdenham a ciência e colocando-os em risco.

Foto: Pedro Ribas/PMC

Meu filho [Jesus] não quer ter seu aniversário lembrado pelo número de mortes, mas sim como escreveu o Apóstolo Paulo: que o seu povo tenha esperança e não somente esperas. Meu filho [Jesus] quer, no seu aniversário, ser lembrado pela luz da vida e a solidariedade entre os povos.

Rafael, você, assim como Jair Messias Bolsonaro – que tanto tem usado indevidamente o nome de meu filho e do nosso Pai – não tem transmitido esperanças. E isto tem deixado meu coração de mãe muito triste.

Rafael Valdomiro Greca de Macedo, mesmo aqui de longe ouvimos o que falou a sua secretária Márcia Huçulak. Você também deve ter ouvido. Ela disse: É um momento crítico, difícil e inesperado. Não é uma época em que teríamos preocupação com a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por conta do período de primavera indo para o verão. Esse é o resultado da decisão da sociedade, já disse isso várias vezes. O tamanho da pandemia é o tamanho do comprometimento de cada um”.

Rafael, ela te isentou de responsabilidade e colocou a culpa pelo número de doentes e mortos no povo. Você sabe que não é assim. Meu filho [Jesus] ajuda-o, como pedistes, mas você tem que mudar muitas coisas, inclusive o seu comportamento, por exemplo, não clame tanto por ele e por mim por que assim dá-nos a impressão que se algo aconteceu errado é por que não fomos capazes de resolver e temos o mundo todo para olhar e ajudar, e claro, registrar o que cada um dos filhos e filhas do nosso Pai fazem.

Decoração de Natal do Parque Barigui. Uma das atrações do Natal de Curitiba – Luz dos Pinhais 2020 – Curitiba, 01/12/2020 – Foto: Daniel Castellano / SMCS

Ao invés de clamar tanto o nosso apoio, use a sabedoria que nosso Pai lhe deu. Olhe o que a ciência – graças ao Pai – te dá de informação e olhe para as necessidades da maioria deste povo, este sim, filho de Deus.

Lembre sempre: “não faça para ninguém aquilo que você não gosta que façam para você” (Tb, 4, 15) e que “é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos céus” (Mt 19,24). Entre tantas coisas que deves observar – e não o faz – lembrei-me no momento destas duas.

Esta seria – imagino eu – uma das cartas que Nossa Senhora da Luz dos Pinhais escreveria para o Rafael Valdomiro Greca de Macedo, que entre nós – por ser um nome mais ‘nobre’ – é conhecido como Rafael Greca.

* Doutor Rosinha é ex-deputado federal e ex-presidente estadual do PT do Paraná. Ele é médico pediatra aposentado da Prefeitura de Curitiba.