O adeus de Teobaldo Amorim

Uma crônica sobre tantas vidas perdidas neste momento





Altemar Alcantara/Semcom/Fotos Públicas

Eu não conhecia Teobaldo Amorim, embora o estimasse bastante. Ele era como um desses parentes distantes que a gente tem obrigação de ter sentimentos apenas por ser da família. Mas de Teobaldo, nem o Amorim do sobrenome me era conhecido. Mesmo assim, o gostava com gosto.

A gente é besta, né. Gosta de tanta gente que nem sabe da nossa existência, apenas por conhecê-las de nome, de um vídeo que viraliza no Instagram, de uma conta que alguém curtiu no Twitter. Mas, da intimidade, do cheiro, do hálito, do toque e distoque, nada sabemos mesmo. Se tem bafo, se cedo toma café com pão e manteiga, se reza antes do almoço – que nunca falte, se dorme de pijama ou pelado.

E essa era a minha relação com Teobaldo Amorim. Provavelmente ele não saiba da minha existência. Se soubesse, talvez não se importasse com ela. Desconfio até que se nos conhecemos de verdade, de apertar a mão, desejar feliz aniversário, feliz natal, como vai a família e outras prosas como a carne tá cara e o feijão também. Se tivéssemos esse grau de intimidade, imagino que ele não gostaria de mim. A gente é assim: quanto mais conhecemos nossos amigos, mais queremos eles distantes.

Eu provavelmente vi Teobaldo Amorim muitas vezes na minha vida, mas não saberia descrever sua fisionomia. Posso ter falado com ele enquanto abastecia o carro, ou quando pedi um remédio pra ressaca na farmácia. Teobaldo Amorim pode ter cruzado comigo na feira, ter mudado de calçada involuntariamente quando íamos nos cruzar ou até comemorado um gol comigo no estádio. Essa última hipótese é mais distante. Desconfio que ele, Teobaldo Amorim, não gostava de futebol. E se gostasse, não torceria pelo meu time que é metido a besta. 

Não, senhor, Teobaldo Amorim é daqueles que não sofre por bola, não entra em bola dividida por política, não crê em deuses, nem questiona quem tem fé. Teobaldo, como um bom Amorim, gosta de feijão com arroz, mas Amorim, como bom Teobaldo, também gosta de carne de onça. E piada boa. E história triste.

Se você conheceu Teobaldo Amorim, por favor, acenda uma vela por ele que se foi. Passou por mim a pouco, em um cortejo simples, enquanto eu observava um belo pé de leis-que-pegam e não-pegam florido por decretos-inúteis e cheio da agridoce fruta “não pode, mas se quiser, pode”. Soube que ele pegou esse vírus que tem levado tantos Teobaldos, tantas Lucenas, tantos crentes e inocentes. É injusto Teobaldo, que tanto cuidava de si, partir pro mundo de lá sem que ao menos eu pudesse lhe dizer: “muito prazer em lhe conhecer, senhor Teobaldo Amorim”.