Apenas metade das escolas paranaenses desenvolvem projetos de combate ao racismo

O levantamento demonstra que, em 2021, o total de escolas públicas com projetos para combater racismo, machismo e homofobia caiu ao menor patamar em 10 anos




FonteAPP-Sindicato

Os projetos voltados à diversidade nas escolas começaram a cair a partir do ano de 2015, quando o índice havia chegado ao maior patamar no período: 75,6%. Foto: Léo Silva/APP-Sindicato

Fundamentais para o desenvolvimento humano e para a construção de uma sociedade plural, temas como racismo, machismo e homofobia perderam espaço nas escolas públicas. De acordo com dados do Sistema Nacional de Avaliação Básica (Saeb), apenas metade (50,1%) das escolas públicas do país desenvolveram ações contra o racismo em 2021. No Paraná, o índice é 52,8%.

O levantamento demonstra que o total de escolas públicas com projetos para combater racismo, machismo e homofobia caiu ao menor patamar em 10 anos. Os dados, compilados pela ONG Todos pela Educação, foram extraídos dos questionários contextuais do Saeb destinados a diretores(as) escolares, entre 2011 a 2021.

Ainda no Paraná, projetos que visam combater o machismo (12,2%)  e a homofobia (18,4%) são menos expressivos ainda, ficando abaixo da média nacional.

Mesmo com toda a mobilização de movimentos sociais em pautar a discussão de raça e gênero, seja a partir de datas como 25 de julho, em que se celebra o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, ou com mobilizações de rua, pautas sociais ainda enfrentam resistência nos currículos escolares.

Queda nos índices e falta de políticas públicas

Os projetos voltados à diversidade nas escolas começaram a cair a partir do ano de 2015, quando o índice havia chegado ao maior patamar no período: 75,6%. Desde então, os números despencaram.

É importante destacar que a data coincide com o início da escalada de discursos conservadores e de extrema-direita, que culminaram no golpe de 2016 e na eleição de Jair Bolsonaro (PL) em 2018.

Em seu governo, Bolsonaro atacou de forma sistemática a educação, a autonomia docente e a pluralidade de ideias. Foi um período marcado pelo avanço de pautas como o Escola Sem Partido, a implantação das escolas Cívico-Militares e sucessivos cortes na educação básica e no ensino superior.

A secretária de Promoção da Igualdade Racial e Combate ao Racismo, Celina Wotkoski, aponta que, quando questões raciais e de gênero não são trabalhadas dentro das escolas, o ensino falha tanto no processo de aprendizagem dos(as) alunos(as) quanto na construção de uma sociedade melhor, com menos violência e desigualdades.

“Falar sobre gênero e raça nas escolas é fundamental para educar os(as) estudantes para garantir uma sociedade mais igualitária e enfrentar as inúmeras desigualdades, discriminações e violências que prejudicam e destroem a vida de tanta gente. A escola é sem dúvida um espaço de formação, o pilar que sustenta a sociedade”, enfatiza Celina.

Lei 10.639 e a falta de aplicação

Outro indicador que aponta um cenário preocupante é a pesquisa divulgada pelo Instituto Alana e Geledés Instituto da Mulher Negra que analisou a aplicação da Lei 10.639/03 nas escolas municipais brasileiras. Completando 20 anos de existência, a lei é um instrumento fundamental na aplicação do ensino da História Afrobrasileira e Africana nas escolas.

Das 1.187 Secretarias Municipais pesquisadas, 71% adotam poucas ou nenhuma ação para efetivamente cumprir a Lei. Apenas 29% desenvolvem ações consistentes. Já 18% não promovem qualquer ação, enquanto 53% realizam apenas atividades esporádicas e projetos isolados ou em datas comemorativas.

Além da abordagem esporádica, 74% das Secretarias relatam a ausência de profissionais ou equipe responsável pelo ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira. Somente 5% afirmam ter um setor específico para planejar a abordagem do tema.

A secretária avalia que, sem a qualificação necessária ou a formação de uma equipe multidisciplinar que trabalhe a temática, muitas redes fazem o mínimo necessário para cumprir a Lei, e não para atender critérios pedagógicos e de qualidade do conteúdo.

“A Educação vai além da transferência de conteúdos técnicos para os(as) estudantes. A escola precisa ser um espaço de acolhimento, respeito e valorização das diversidades. Melhorar a qualidade da Educação brasileira significa também promover um ensino intencionalmente antirracista e voltado para as relações étnico-raciais, além de olhar com atenção para ações de combate ao machismo e à homofobia”, finaliza a secretária.

MEC retoma projetos

Em nota publicada no portal Agência Brasil, o Ministério da Educação esclarece que tem trabalhado para modificar esse cenário. Como primeira ação, o MEC recriou a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi).

A pasta tem em sua estrutura a Diretoria de Políticas de Educação Étnico-racial Educação Escolar Quilombola, um instrumento institucional para formular, articular e executar as políticas voltadas para a implementação da Lei 10.639/03.

O MEC anunciou ainda a retomada da formação de professores(as) a partir do apoio financeiro às universidades e relançado o Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento, que fomenta a pesquisa na graduação e pós-graduação.