Evento no Circo Voador consolida frente das esquerdas

Acontecimento nas últimas semanas revelam esquerda unida e direta dividida





Ricardo Stuckert

 

O medo aproxima | Às vésperas da possível prisão do ex-presidente Lula ou do cumprimento da constituição que prevê a liberdade até que seja cumprida todas as etapas jurídicas, é cada vez mais possível pintar uma união das esquerdas brasileiras. Aliança talvez desejada, mas rechaçada no período de Dilma Rousseff, agora ela se torna possível pelo instinto de sobrevivência. Essa unidade pode caminhar para o entendimento de que, independente da candidatura, é necessário combater os reais adversários. Do outro lado, a divisão nas lideranças e campos da direita após a improvável concordância “programática” no golpe, é cada vez mais perceptível.

Da vaia à mão estendida | Se a esquerda não se uniu no amor, tem se aconchegado na dor. É o que aparenta os três atos seguidos que unificaram no mesmo palanque PT, PSOL e PCdoB. Juntos, as diferenças foram deixadas um pouco de lado para enfrentar o fascismo que cresce no país. No primeiro ato, quando da morte da vereadora Marielle Franco, parte da solidariedade petista expressada na voz do senador Lindbergh Farias foi vaiada. Parecia que o PT não podia sentir a dor de uma mulher negra, lésbica e militante das causas sociais. A rejeição partia não das lideranças do PSOL, mas de uma militância que enxergava mais as diferenças do que as semelhanças com partidos do mesmo campo.

Todos são alvos | A cisão diminuiu quando a caravana de Lula sofreu vários ataques no sul do país, culminando com os tiros disparados contra dois ônibus. A resposta a essa violência foi o compartilhamento de palco por Lula, Manuela e Guilherme Boulos. A camiseta da Manu, “Nossas ideias são à prova de bala”, é a síntese dessa fraternidade que surge. É bem verdade que ambos dividiram o palco em 24 de janeiro, em Porto Alegre, mas ainda sem o peso de agirem coesos na pauta política.

Um por todos | A consolidação dessa união se pinta no ato realizado no Circo Voador (RJ), no dia 2 de abril. Com o lema “Frente contra o fascismo”, Lula, Manuela e Freixo aproximam ainda mais o desejo de uma corrente unificada. Novamente, Manuela deu o tom dessa aliança: “Nós sabemos que a luta contra o fascismo é a luta que nós devemos travar a favor da democracia. O nosso Brasil, a bandeira que é nossa, o sonho que é nosso, nós não entregaremos aos fascistas, aos homofóbicos, aos racistas, aos machistas!”.

Nem Uma a Menos | Lula também não atravessou o samba e destacou a importância dessa proximidade que nasceu dos ataques sofridos e da execução de Marielle Franco. “Esse ato é um marco, @MarceloFreixo. Veja, ter uma mulher candidata como a @ManuelaDavila, um jovem como o @GuilhermeBoulos. A democracia só vai se consolidar quando aprendermos a conviver na adversidade. Isso não é uma seita. É aprender a respeitar a liberdade do outro”, avaliou.

Cada um por si | Do outro lado, é cada vez mais latente o desespero da direita para ter uma candidatura convincente. Temer, Bolsonaro, Alckmin, Álvaro Dias, cada um é uma ilha em propostas e plataforma eleitoral. A única coisa que eles têm a oferecer é algo que não depende deles, ou seja, a prisão de Lula. Mas depois disso, o que poderão dar ao eleitorado? Repressão policial, cortes em serviços públicos, desemprego em nome da estabilidade econômica e outras pautas liberais podem não ser suficientes para conter essa fusão das esquerdas.

Voo solo | Por fim, ainda surge a dúvida daqueles que querem se mostrar como terceira via. Ciro Gomes, Marina Silva e agora Joaquim Barbosa dificilmente se tornarão viáveis sem se sentar a mesa com esses grupos, sem subir, desde já, nesses palanques. A estratégia de ficar na platéia a espera de ser anunciado pode ser tarde demais para essas candidaturas.