OAB é contra prisão em segunda instância e licença para matar

Parecer da Ordem traz duras críticas de juristas a proposta do ministro Sérgio Moro





Ministro da justiça, Sérgio Moro fala sobre o plano de segurança pública. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

A OAB entregou ao presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (DEM) seu parecer sobre o Pacote Anti-Crimes apresentado pelo ministro da Justiça Sérgio Moro (sem partido). Com a colaboração dos principais juristas e institutos do país, o relatório condenou propostas do ex-juiz por elevar a violência, perseguir os mais pobres e não trazer soluções efetivas no combate à criminalidade. Em um dos trechos, o parecer afirma que tal proposta virou “chacota entre profissionais da justiça criminal”.

O ministro da Justiça Sérgio Moro “sentiu”os efeitos dessa reunião. Tanto que no mesmo dia ele utilizou sua conta no Twitter para defender o Pacote Anti-crimes, em especial as partes que tratam do “excludente de ilicitude” que amplia a possibilidade de impunidade para crimes cometidos em legítima defesa. Sem mencionar a Ordem dos Advogados do Brasil, Moro disse “para desinformados seria uma norma bárbara, uma licença para matar. Já mostrei aqui que o texto proposto é uma cópia da Seção 33 do Código Penal Alemão. Mas também tem disposição quase idêntica no Código penal português, art. 33, sobre excesso em legítima defesa”.

Sérgio Moro volta a defender projeto “com licença para matar”

É justamente esse trecho um dos mais criticados pelos especialistas no parecer com mais de 80 páginas que é assinado pelos maiores juristas do país e foi aprovado no dia 8 de abril pelos conselheiros da OAB.

Para a Ordem, “há forte consenso pela rejeição da proposta que dá licença para diante de forte emoção”. O parecer cita análise do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais sobre os riscos do projeto. O IBCCRIM entende como errado ” subverter a racionalidade hierárquica na importância dos bens jurídicos e ao permitir que um agente de segurança acusado de excesso no uso da força letal, supostamente treinado, possa receber perdão judicial mediante a mera declaração de que estava com medo”.

Para o presidente do Instituto de Criminologia e Política Criminal, jurista e professor Juarez Cirino dos Santos, a ampliação dos limites da justificação é ainda mais grave, porque incorpora as situações indefiníveis de conflito armado ou de risco de conflito armado, que subjetivam a definição da situação justificante e criam insegurança para o cidadão.

“A mudança proposta, já repudiada pela literatura e jurisprudência internacionais – que rejeitam a existência de duas antijuridicidades, uma mais rigorosa para o cidadão comum, outra mais tolerante para o agente do Estado -, vai recrudescer a matança em massa de jovens negros e pobres por policiais e agentes de segurança do Estado, além de virar objeto de pilhéria acadêmica, ou da chacota entre profissionais da justiça criminal”, enfatiza Cirino.

Outra crítica contundente partiu de Lenio Luiz Streck, jurista brasileiro, conhecido principalmente por seus trabalhos voltados à filosofia do direito e à hermenêutica jurídica. Para ele, citado no parecer, “as propostas ora em análise, assentadas em uma lógica de guerra, apenas trarão mais vítimas, civis, policiais e mesmo criminosos, cuja pena deve ser dada por um juiz, não um fuzil”.

Rodrigo Maia visita OAB para receber parecer sobre projeto Anti-Crime. Foto: Eugênio Novaes/OAB

Prisão em segunda instância
Centro de uma polêmica nacional principalmente após a prisão do ex-presidente Lula, as prisões em segunda instância também são objeto do projeto do ex-juiz Sérgio Moro criticado pela OAB. Ao encaminhar a proposta para o legislativo, Moro acaba por reconhecer a ilegalidade das prisões nessa fase.

É o mesmo entendimento do grupo de trabalho que se debruçou sobre esse tema. Para eles, a “ proposta é inconstitucional, conforme já reconheceu o próprio Conselho Federal da OAB, por unanimidade, na sessão de 24 de fevereiro de 2016, ao autorizar o ingresso de Ação Declaratória de Constitucionalidade do art.283 do CPP, ao argumento de que a execução da pena, antes do trânsito em julgado ofende o princípio constitucional da presunção de inocência”.