Deputados e prefeitos repudiam propostas que querem acabar com mais de 100 municípios do Estado

Parlamentares e representantes dos municípios aprovaram a Carta do Paraná




FonteThiago Alonso e Thaís Faccio - Alep

Parlamentares e representantes dos municípios aprovaram a Carta do Paraná, que reage às propostas federais que preveem extinção de cidades com até cinco mil habitantes. Foto: Orlando Kissner/Alep

Dezenas de deputados estaduais e centenas de prefeitos, vereadores e representantes de entidades municipalistas lotaram nesta terça-feira (12) o Plenário da Assembleia Legislativa do Paraná para repudiar duas propostas que tramitam no Senado e que, em sua essência, preveem a extinção e incorporação de cidades com até cinco mil habitantes. Durante o encontro, foi aprovada a Carta do Paraná, redigida e lida pelo primeiro secretário da Assembleia, deputado Luiz Claudio Romanelli (PSB), propositor da Audiência Pública.

No Paraná, 104 municípios serão atingidos, causando um prejuízo de R$ 682 milhões, segundo estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). A vida de mais de meio milhão de pessoas seria impactada no Estado. De acordo com parlamentares e prefeitos, as mudanças causariam problemas que vão desde o repasse de recursos até o oferecimento de serviços básicos, como o de atendimento à saúde.

Estima-se que as mudanças devam atingir 1.281 cidades em todo o Brasil. Para o deputado Romanelli, isto representa uma falta de desconhecimento da realidade. “Na verdade, estamos falando de uma proposta estapafúrdia, uma falta de respeito com os quase meio milhão de paranaenses que moram nestas 104 cidades”, afirmou. “Sabemos que a criação destes municípios é fruto da luta das suas comunidades, das suas associações de produtores, dos sindicatos rurais, das suas entidades representativas e dos políticos locais que lutaram para emancipar seus municípios”, lembrou.

Para ele, as propostas são uma falta de respeito e de consideração com essa população que mora nestes municípios. “Essa proposta tem de ser repudiada por todos os paranaenses, mas principalmente por aqueles que conhecem a vida do interior do Paraná. Quem vive no interior tem o direito de ter políticas públicas adequadas”, enfatizou Romanelli.

Para o presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, deputado Ademar Traiano (PSDB), essa é uma decisão que gera uma mudança radical. “O atendimento a população é totalmente diferente no interior, as estruturas que se oferece à nossa gente, através destes novos munícipios é diferenciada. Você não pode tomar uma decisão dessas com base em quem não conhece a realidade do interior do Paraná. Nós estamos aqui para defender o municipalismo”, disse.

Carta do Paraná – O documento, que será enviado a deputados federais e senadores paranaenses, com cópia a demais parlamentares do Congresso Nacional, repudia as intenções das propostas. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n° 188/19, de autoria de vários senadores, prevê a extinção de municípios com menos de cinco mil habitantes que não comprovarem receita própria. Já o Projeto de Lei Complementar n° 195/19, de autoria do senador Oriovisto Guimarães (PODE-PR), trata de procedimentos para incorporação e fusão de municípios. O texto da Carta do Paraná considera as propostas um desrespeito à “história dos 104 municípios que podem ser atingidos no Estado do Paraná, a importância social, econômica e cultural dos mesmos, além de demostraram profundo desconhecimento da realidade dos pequenos municípios”.

União – Prefeito de Pérola e presidente da Associação dos Municípios do Paraná (AMP-PR), Darlan Scalco, afirmou que a audiência é de suma importância, pois demonstra a união dos prefeitos e deputados em torno de uma causa comum. “O que não concordamos é com um único critério que fará com que 82% dos municípios que não tem esse índice (10% de receita própria) sejam eliminados”, disse. Para ele, os critérios devem ser mais bem debatidos. “Somos sim favoráveis a cortes, mas tem que cortar tudo: prefeitos, vereadores, deputados, senadores, Ministério Público, Judiciário. É isso que queremos. Entrar nessa discussão. Não é cortando a tia do café que vai consertar o resultado negativo da empresa, mas sim realizando um estudo e fazendo aquilo que é necessário”.

O diretor financeiro da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Joarez Lima Henrichs, disse que a entidade faz uma defesa enfática na permanência dos municípios. “Os prefeitos devem fazer o dever de casa, mas a qualidade de vida hoje está nos pequenos municípios, não está nos grandes. Por isso, que defendemos essa discussão”, explicou.

A contrariedade à proposta uniu também parlamentares que geralmente estão em lados opostos. É o caso do líder do Governo na Assembleia, deputado Hussein Bakri (PSD), e da Oposição, Professor Lemos (PT). Para Bakri, a defesa dos municípios alcançou a unanimidade. “Não vamos mais apoiar deputados federais e senadores que defenderem a extinção dos municípios”, disse. Lemos afirmou que o projeto não é de interesse público. “Aqui na Assembleia não tem um só deputado que é a favor dessa aberração. A Carta do Paraná vai reforçar esta luta importante”.

O deputado estadual do Rio Grande do Sul, Vilmar Perin Zanchin (MDB-RS), representou a União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais (Unale) no ato. “Quem fez esta proposta nunca pisou em um destes 1200 municípios do Brasil. Vamos marchar juntos até Brasília e derrotar esta proposta”.

A Audiência Pública contou ainda com a participação dos deputados Alexandre Curi (PSB), Arilson Chiorato (PT), Tadeu Veneri (PT), Anibelli Neto (MDB), Paulo Litro (PSDB), Dr. Batista (PMN), Evandro Araújo (PSC), Tercílio Turini (CDN), Galo (PODE), Cobra Repórter (PSD), Nelson Luersen (PDT), Luciana Rafagnin (PT), Cristina Silvestri (CDN), Delegado Recalcatti (PSD), Goura (PDT), Marcel Micheletto (PL), Tiago Amaral (PSB), Artagão Jr. (PSB), Subtenente Everton (PSL), Reichembach (PSC), Gilson de Souza (PSC) e Requião Filho (MDB).

Os presidentes das associações de municípios de todas as regiões do Estado também estiveram presentes. O assessor jurídico da Associação dos Vereadores do Paraná (UVEPAR), Paulo Sergio Guedes, também participou do ato.

Prejuízos – O estudo da CNM que mostra a perda de arrecadação dos 1.820 municípios (tanto os que podem ser extintos quanto os que vão agregá-los) afetados pela PEC do Pacto Federativo pode chegar a R$ 7 bilhões. No Paraná, esse montante chega a R$ 682 milhões e é a quarta maior perda de arrecadação, atrás apenas de Minas Gerais (R$ 1,4 bilhão), Rio Grande do Sul (R$ 1 bilhão) e São Paulo (R$ 963,3 milhões).

Pelo estudo da CNM, não só os 1.217 municípios que serão extintos perderão receita como também as 702 cidades que os incorporarão. Pela proposta, serão extintos os municípios com menos de cinco mil habitantes e arrecadação própria menor de 10% da sua receita total. No Paraná, 25% dos municípios deixarão de existir. Hoje, a arrecadação do Fundo de Participação dos Municípios das cidades afetadas é de R$ 25,1 bilhões, valor que pode cair para R$ 18,05 bilhões depois da fusão.

Cidades ameaçadas – No Paraná, poderão ser extintos os munícios de Altamira do Paraná, Alto Paraíso, Anahy, Ângulo, Arapuã, Ariranha do Ivaí, Atalaia, Barra do Jacaré, Bela Vista da Caroba, Boa Esperança, Boa Esperança do Iguaçu, Bom Jesus do Sul, Bom Sucesso do Sul, Brasilândia do Sul, Cafeara, Cafezal do Sul, Campina do Simão, Campo Bonito, Conselheiro Mairinck, Corumbataí do Sul, Cruzeiro do Iguaçu, Cruzeiro do Sul, Cruzmaltina, Diamante do Sul, Entre Rios do Oeste, Esperança Nova, Espigão Alto do Iguaçu, Farol, Fênix, Flor da Serra do Sul, Floraí, Flórida, Foz do Jordão, Godoy Moreira, Guapirama, Guaporema, Iguaraçu, Iguatu, Inajá, Indianópolis, Iracema do Oeste, Itaguajé, Itaúna do Sul, Ivatuba, Japira, Jardim Olinda, Jundiaí do Sul, Kaloré, Leópolis, Lidianópolis, Lindoeste, Lobato, Lunardelli, Lupionópolis, Manfrinópolis, Marquinho, Marumbi, Mato Rico, Mirador, Miraselva, Munhoz de Melo, Nossa Senhora das Graças, Nova Aliança do Ivaí, Nova América da Colina, Nova Santa Bárbara, Novo Itacolomi, Ourizona, Paranapoema, Pinhal de São Bento, Pitangueiras, Planaltina do Paraná, Porto Amazonas, Porto Barreiro, Porto Rico, Porto Vitória, Prado Ferreira, Quarto Centenário, Quatro Pontes, Quinta do Sol, Ramilândia, Rancho Alegre, Rancho Alegre d’Oeste, Rio Bom, Rio Branco do Ivaí, Rosário do Ivaí, Salgado Filho, Salto do Itararé, Santa Amélia, Santa Cecília do Pavão, Santa Inês, Santa Lúcia, Santa Mônica, Santana do Itararé, Santo Antônio do Caiuá, Santo Antônio do Paraíso, São José das Palmeiras, São Manoel do Paraná, São Pedro do Paraná, Serranópolis do Iguaçu, Sulina, Uniflor e Virmond.

Encontro lotou o plenário do Legislativo paranaense para debater os efeitos que causaria aos municípios e à população a extinção de mais de 100 cidades no estado. Foto: Dalie Felberg/Alep

Prefeitos falam sobre o impacto da PEC 188/2019 durante audiência pública na Assembleia Legislativa

Os prefeitos paranaenses falaram sobre o impacto da possível aprovação da PEC 188/2019 no Congresso Nacional durante audiência pública realizada na manhã desta quarta-feira (12) na Assembleia Legislativa do Paraná. Para o prefeito de Barra do Jacaré, Adalberto de Freitas Aguiar (PP), o maior prejuízo que a proposta trará será a perda da emancipação. “Nosso munícipio foi emancipado em 1963 e tem toda a sua história e essa lei tira tudo aquilo que nós conseguimos a vida inteira”, disse, ao observar que por muito tempo a cidade foi esquecida, mas que de uns tempos para cá as coisas melhoraram. “Nosso município é totalmente agrícola e estamos caminhando bem. Temos uma arrecadação que gira em torno de R$ 1,2 milhão, folha de pagamento que estava alta, mas baixamos para 49%, uma das menores da região Norte e investimos 23% em saúde”, explicou, ao complementar que também estão fazendo pavimentação com emenda do Estado e com os recursos próprios.

“Estamos na luta por todos os municípios que hoje estão ameaçados por essa medida louca que não tem fundamento lógico”, afirmou. Para o prefeito, que recentemente esteve em Brasília para tratar do tema, o que causa o prejuízo não é o fato dos municípios não atingirem os 10%, mas sim o Governo não repassar aos municípios o que é deles de direito.

Apoio – O presidente da Câmara de Vereadores da cidade, vereador Izael Dutra (PDT), que sugeriu a realização do evento ao primeiro secretário, Luiz Claudio Romanelli (PSB), também falou sobre a proposta. Para ele, ela não deverá prosperar em Brasília e a manifestação dos deputados paranaenses é muito importante. “Quando recebemos essa notícia, imediatamente conversamos com o deputado Romanelli, que sempre foi um municipalista e defensor dos municípios para que ele convocasse uma audiência para debater esse tema. Ele prontamente atendeu nosso pedido e hoje promoveu esse importante debate”, explicou o vereador da cidade que tem perto de 3 mil habitantes e seria incorporada ao município de Andirá.

O prefeito de Santa Lúcia, Renato Tonidantel (MDB), também acredita que a extinção irá prejudicar muito as cidades. “Nossa cidade se desenvolveu de forma extraordinária após sua emancipação e retroagir agora e voltar a pertencer a Capitão Leônidas Marques seria ruim ao desenvolvimento local”, disse, ao citar que a cidade melhorou os índices de desenvolvimento e as ações diretas à comunidade.

Para ele, este evento é muito importante para fortalecer o apoio de todos os deputados à causa. “O projeto deve ser analisado e discutido para que não seja aprovado. Temos que pensar no desenvolvimento da nossa gente e eu penso que o poder público deve estar cada dia mais próximo à sociedade e não retroagir e distanciar a comunidade de seus agentes públicos”, comentou, ao afirmar que a aprovação da PEC terá um impacto muito negativo à cidade de Santa Lúcia e a sociedade também irá sentir. A cidade tem quase 4 mil habitantes.

União – Presidente da Associação Municipal do Norte do Paraná (Amunop), prefeito de Sertaneja, Jamison Donizete (PSD), afirmou ser totalmente contrário a proposta porque é nos pequenos municípios que a população reside e é lá que a atividade pública é feita. “Não acreditamos que essa propositura seja a solução dos problemas que o país enfrenta. A Assembleia está de parabéns por essa brilhante iniciativa de discutir a nível estadual esse tema e dar a oportunidade para nos manifestarmos. A classe política se uniu nesse tema que é muito importante para todos”. A Amunop representa 20 municípios, dos quais oito podem ser extintos com a possível aprovação da PEC.

A cidade de Jussara tem pouco mais de 7 mil habitantes e não seria afetada pela proposta, mas o prefeito Moacir Luiz Pereira Valentin, o Tatinha (PSDB) não vê com bons olhos a PEC. Ele que também preside a Associação dos Municípios do Médio Noroeste do Paraná (Amenorte) e representa 11 municípios, dos quais dois (Guaporema e São Manoel do Paraná) podem ser extintos. “Será que Indianópolis que incorporaria São Manoel do Paraná e Rondon que agregaria Guaporema teria condições de atender com saúde, segurança e demais serviços essa população?”, indagou ao comentar que as populações teriam muito a perder com essas incorporações. “Sabemos que as cidades de pequeno porte possuem estrutura para manter suas comunidades”, disse ao ressaltar que o apoio e a luta dos deputados são fundamentaist nessa luta.

Para o prefeito de Marumbi, Adhemar Francisco Rejani (PMB) a medida seria um retrocesso. “Nossa cidade perderia na saúde, na educação e na agricultura. Porque o munícipio sede não teria condições financeiras de dar um tratamento bom à nossa comunidade”, disse ao citar o fato de a cidade possuir um hospital municipal e atender os demais munícipes. Para ele, eventos como esse da Assembleia são bons para mostrar para a população e para o Estado que isso não pode acontecer. “Isso seria um prejuízo muito grande para estas cidades. Por exemplo, esse ano vamos conseguir implementar o ensino integral, mas se fossemos distrito não conseguiremos isso e nem projetos de investimentos do Estado”, observou. A cidade hoje conta com mais de 4 mil habitantes.