Governo do Paraná aposta na cloroquina para tratar infectados pela Covid-19

Sem eficácia comprovada e com grandes riscos, Ratinho Junior compra grandes lotes do produto





Governador Ratinho Junior negocia a compra de 154 mil doses de hidroxicloroquina genérica do grupo farmacêutico Novartis/Sandoz. Foto: Rodrigo Félix Leal/AEn

Com quase mil casos confirmados, o Governo do Paraná está apostando no uso da cloroquina para tratar os pacientes confirmados com a Covid-19. Incentivado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como solução no tratamento da pandemia, o estado distribuiu 17 mil comprimidos do medicamento cloroquina para todas as Regionais e 28 hospitais de referência. A quantidade é suficiente para 850 tratamentos. Sem comprovação científica, a taxa de mortalidade é a mesma de quem não usa o medicamento que tem diversos efeitos colaterais.

Segundo o governo do estado, o uso da cloroquina como medicamento pode ser usado em pacientes com infecções graves da Covid-19 e que precisam de internamento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Por ser uma doença nova, ainda não há evidências científicas suficientes que comprovem a eficácia para casos de coronavírus. A cloroquina e a hidroxicloroquina devem ser usadas como “coadjuvantes” no tratamento. Além dos 17 mil comprimidos já recebidos, o Paraná deve receber outro lote com 27 mil do Ministério da Saúde.

“Como ainda não temos tratamento específico e eficaz até o momento, o Ministério da Saúde considerou a utilização da cloroquina em caráter temporário, de acordo com critério da equipe médica dos hospitais”, disse o secretário da Saúde, Beto Preto.

O Paraná ainda está recebendo 154 mil doses de hidroxicloroquina genérica do grupo farmacêutico Novartis/Sandoz, que tem uma planta em Cambé, no Norte do Estado.

Presidente da República, Jair Bolsonaro. Foto: Marcos Corrêa/PR

Tratamento polêmico

O uso da cloroquina e hidroxicloroquina gera polêmica no Brasil. Ele é patrocinado, principalmente, pelo presidente Jair Bolsonaro, que citou os medicamentos como solução para a pandemia que ele trata como gripezinha. Ao aderir aos produtos, o Governo do Paraná se sustenta em uma nota técnica do Ministério da Saúde.

“Algumas publicações científicas internacionais têm sugerido que esses fármacos podem inibir a replicação de SARS COV, por meio da glicosilação terminal da Enzima Conversora de Angiotensina 2, produzida pelos vasos pulmonares, que pode afetar negativamente a ligação vírus receptor (Al Bari, 2017 e Savarino 2006)”, diz a nota do MS sem citar os riscos ao paciente.

O uso dos medicamentos não encontra a mesma segurança em estudo publicado pela Sociedade Brasileira de Infectologia. De acordo com a entidade, não há medicamento comprovadamente seguro e eficaz para ser usado contra a infecção pelo novo
coronavírus (COVID-19) e que o uso da hidroxicloroquina é experimental.

“O estudo francês que mostrou “algum benefício“ para COVID-19 supracitado está sendo criticado cientificamente por apresentar várias limitações, incluindo ser um estudo aberto, não randomizado e que incluiu menos pacientes (apenas 42) do que os próprios autores
calcularam”, aponta a SBI. A Sociedade ainda ponta os malefícios como discrasia
sanguínea, distúrbios gastrintestinais (náuseas, vômitos, diarreia), fraqueza muscular, labilidade emocional, erupções cutâneas, cefaleia, turvação visual, descoloração do cabelo ou alopecia e tontura, concluindo-se que “contraindicamos seu uso para casos não críticos; tampouco como “profilático”, atesta a SBI.

Já a Fiocruz alerta para o risco de mortes provocados pela dosagem alta de cloroquina. “A dose diária de cloroquina deve ser inferior a 25 mg/kg, pois uma única dose de 30 mg/kg pode ser fatal”. Para a Fundação, o medicamento não pode ser usado em altas dosagens e “em massa”, no tratamento da maioria dos pacientes, como sugere o governo estadual.”

“Devido a inexistência de medicamentos seguros e efetivos para enfrentar essa doença, a cloroquina pode ser uma alternativa terapêutica. Porém, existem contraindicações que devem ser analisadas assim como o alto número de interações medicamentosas, especialmente em pacientes gravemente doentes. Seu uso deve ser circunscrito a ensaios clínicos randomizados com acompanhamento clínico rigoroso e critérios de inclusão e de exclusão rígidos. Qualquer que seja o protocolo a ser utilizado, a dose diária total não
deve ser superior a 25 mg/kg e o tempo de uso não deveria ser maior que 20 dias”, avalia a nota técnica.